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quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Cade investiga se Petrobras favoreceu distribuidoras de gás natural

A Superintedência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) instaurou processo administrativo contra a Petrobras para investigar suposta prática anticoncorrencial de abuso de posição dominante e de limitação, falseamento e prejuízo à livre concorrência no mercado de gás natural canalizado no Estado de São Paulo. A abertura da investigação está formalizada no Diário Oficial da União (DOU).

O processo foi iniciado com base em denúncia feita pela Companhia de Gás de São Paulo (Comgás) em março do ano passado. A Petrobras estaria fornecendo gás natural com suposto favorecimento às distribuidoras do Sistema Petrobrás.

Dentre as reclamações da Comgás, a empresa alega que a Petrobras dispensava tratamento discriminatório no Estado por meio de descontos que beneficiariam a Gás Brasiliano Distribuidora (GBD), concessionária de propriedade da Petrobras.

A Petrobras tem 30 dias para apresentar defesa. Ao final da instrução processual, a Superintendência opinará pela condenação da representada ou arquivamento do processo e remeterá o caso para julgamento do Tribunal Administrativo do Cade, responsável pela decisão final.

fonte: Agência Estado




NOTA TÉCNICA Nº 48/2015/CGAA4/SGA1/SG/CADE

INQUÉRITO ADMINISTRATIVO Nº 08012.002600/2014-30
Representante: Companhia de Gás de São Paulo
Advogados/as: Juliano Souza de Albuquerque Maranhão, Tamara Hoff, Tercio Sampaio Ferraz Junior e outros/as
Representada: Petróleo Brasileiro S.A.
Advogados/as: Alex Azevedo Messeder, Juliana Carneiro Martins de Menezes e outros/as



EMENTA: Inquérito Administrativo. Representante: Companhia de Gás de São Paulo. Representada: Petróleo Brasileiro S.A. Suposta conduta unilateral de discriminação de preços e condições de contratação. Setor de transporte e distribuição de gás natural canalizado. Instauração de processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica a partir de Inquérito Administrativo instaurado pela Superintendência-Geral do Cade, nos termos dos arts. 13, V, e 67 da Lei nº 12.529/2011, c/c os arts. 135 e seguintes do Regimento Interno do Cade.

VERSÃO PÚBLICA

Por meio do presente documento, a Superintendência-Geral do Cade encerra a análise em fase de inquérito administrativo do processo em referência, cujo objeto é denúncia da Representante Comgás em face da Representada Petrobras alegando suposta discriminação anticompetitiva no fornecimento de gás natural às distribuidoras de gás natural canalizado, com suposto favorecimento às distribuidoras integradas ao Sistema Petrobras. São expostos os indícios apurados durante a fase de inquérito, do que se conclui pela necessidade de instauração de processo administrativo, nos termos dos arts. 13, V, e 67 da Lei nº 12.529/2011, c/c os arts. 135 e seguintes do Regimento Interno do Cade.

Continua
SUMÁRIO


1.              Trata-se de Inquérito Administrativo para Apuração de Infrações à Ordem Econômica originado de representação fundamentada (fls. 01-27) da Companhia de Gás de São Paulo (“Comgás” ou “Representante”) e instaurado por despacho de 17 de abril de 2014 (fl. 278), que acolheu as razões de Nota Técnica nº 117/2014 (fls. 275-7) em virtude de alegada prática anticoncorrencial de abuso de posição dominante e de limitação, falseamento e prejuízo à livre concorrência, passível de ser enquadrada nos incisos IV (criar dificuldades à constituição, ao funcionamento, ou ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor, adquirente ou financiador de bens ou serviços) e X (discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços por mei2o da fixação diferenciada de preços, ou de condições operacionais de venda ou prestação de serviços) do §3º do art. 36 da Lei nº 12.529/2014, combinados com os incisos I e IV do caput do mesmo dispositivo, correspondentes ao art. 20, incisos I e IV, combinados com o art. 21, incisos V e XII, da Lei nº 8.884/1994. Consta como Representada no presente feito a seguinte pessoa jurídica:
                                                 i.                   Petróleo Brasileiro S.A. (“Petrobras”), pessoa jurídica de direito público federal, registrada no CPNJ sob o nº 33.000.167/0001-01, com sede na Avenida República do Chile, nº 65/502, Centro, Rio de Janeiro, RJ.

2.              O procedimento teve início com a apresentação por parte da Comgás, em 27 de março de 2014, de representação fundamentada em face da Petrobras em virtude de suposta infração à ordem econômica consistente em tratamento discriminatório no fornecimento de gás natural para as distribuidoras de gás natural canalizado do Estado de São Paulo, em particular por meio de descontos que beneficiariam a Gás Brasiliano Distribuidora S.A. (“GBD”), concessionária de propriedade da Petrobras, em detrimento da Comgás. A representação discorre sobre: (i) preocupações concorrenciais advindas da posição dominante da Petrobras na cadeia do gás natural; (ii) a atuação do Cade em processos relativos à Petrobras nesse setor; (iii) a suposta conduta discriminatória no caso concreto; e (iv) a natureza concorrencial, e não exclusivamente privada, da suposta conduta. A Representante juntou ainda 14 documentos, dentre eles instrumentos de mandato, peças de informação, documentos comprobatórios e dois pareceres, um deles de autoria da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (“ANP”), intitulado “Análise da regulamentação, da estrutura da indústria e da dinâmica de formação dos preços de gás natural no Brasil” (Nota Técnica Conjunta nº 002/2011-CDC-SCM, fls. 226-69), e o outro de autoria da Consultoria Empresarial em Energia e Regulação Ltda. (“Zenergás”), sobre a “Aplicação do princípio da isonomia às Concessionárias prestadoras dos serviços de distribuição de gás canalizado no Estado de São Paulo, no que se refere a cláusulas nos contratos de suprimento de gás” (fls. 271-4).
3.              A partir da representação, o Despacho nº 442/2014 (fl. 278) determinou a instauração de inquérito administrativo, acolhendo a Nota Técnica nº 117/2014/SG/CADE (fls. 275-7) que entendeu pela existência de indícios de condutas anticoncorrenciais por parte da PETROBRAS que, se confirmados, podem ser passíveis de enquadramento na legislação de defesa da concorrência, exigindo-se, portanto, uma análise mais cuidadosa.
4.              A Representada foi devidamente intimada por meio do Ofício nº 1613/2014/SG/CADE para que apresentasse manifestação sobre as alegações trazidas na representação. Em resposta juntada às fls. 292-318, a Representada discorre sobre: (i) a duplicidade de procedimentos nas esferas judicial e administrativa; (ii) a diferença nas espécies de contratos de fornecimento de gás; (iii) o histórico de negociação com a Representante; e (iv) o caráter alegadamente isonômico do desconto concedido e a inexistência de discriminação ilícita na venda do gás. A manifestação foi acompanhada de 36 anexos, entre instrumentos de mandato, peças de informação e documentos comprobatórios.
5.              Após a contestação da Representada, esta Superintendência-Geral do Cade (“SG”) procedeu ao envio de uma rodada de ofícios para colher a opinião da Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (“ARSESP”, Ofício nº 2233/2014/SG/CADE, fls. 530-1) e da terceira distribuidora de gás canalizado do estado, Gás Natural São Paulo Sul (“SPS”, Ofício nº 2287/2014/SG/CADE, fls. 534-6), bem como para questionar à Petrobras mais detalhes acerca da prática de descontos (Ofício nº 2288/2014/SG/CADE, fls. 538-42) e para colher a réplica da Comgás (Ofício nº 2289/2014/SG/CADE, fls. 544-5).
6.              Posteriormente à chegada das respostas, foi necessária nova rodada de instrução, tendo-se oficiado: a Petrobras, para colher tréplica e elucidar aspectos do histórico de negociação contratual com as distribuidoras de gás canalizado (Ofício nº 2896/2014/SG/CADE, fls. 601-3); a ARSESP, para colher informações e opinião sobre as condições de migração contratual oferecidas pela Representada (Ofício nº 2897/2014/SG/CADE, fls.619-21); a Comgás, para elucidar controvérsias de natureza privada entre as partes (Ofício nº 2898/2014/SG/CADE, fls. 610-2); e o Grupo Gás Natural Fenosa, para apurar elementos da suposta conduta de discriminação (Ofício nº 2899/2014/SG/CADE, fls. 607-8).
7.              A seguir, foram enviados à Petrobras os Ofícios SG/CADE nº 3896/2014 (solicitando maiores explicações sobre o motivo de não estender os descontos a todos os contratos, fls. 731-3), nº 4196/2014 (solicitando justificativa de pedido de sigilo, fls.744-5) e nº 4781/2014 (fls. 805-6, para comunicar a decisão do Despacho nº 1326/2014, fl. 804, que determinou a abertura de informações protocoladas como de acesso restrito, conforme análise da Nota Técnica nº 343/2014/SG/CADE, fls. 797-803).
8.              Em virtude de dúvida de natureza técnica, enviou-se o Ofício 4725/2014/SG/CADE (fls. 789-90) à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
9.              Abaixo se encontra tabela com os dados sobre os ofícios enviados pela SG e as folhas dos autos em que foram acostadas as respostas.

Tabela 1 – Lista de ofícios enviados pela SG e folhas em que as respostas foram acostadas aos autos
Destinatária
Ofício n°
Ofício fls.
Fls. resposta versão pública
(autos públicos)
Fls. versão de acesso restrito
(respectivos autos)
Petrobras
1613/2014
279
292-318
-
ARSESP
2233/2014
530-531
558-562
-
Gás Natural São Paulo Sul
2287/2014
534-536
554-556
3-5
(restrito Cade)
Petrobras
2288/2014
538-542
591-600
2-11
(restrito Cade e Petrobras)
Comgás
2289/2014
544-545
572-589
383-401
(restrito Cade e Comgás)
Petrobras
2896/2014
601-603
638-663
154-179
(restrito Cade e Petrobras)
ARSESP
2897/2014
619-621
726-727
216-217
(restrito Cade e Petrobras)
Comgás
2898/2014
607-608
694-703
452-462
(restrito Cade e Comgás)
Grupo Gás Natural Fenosa
2899/2014
610-612
630-631
53-54
(restrito Cade)
Petrobras
3869/2014
731-733
755-757
271-273
(restrito Cade e Petrobras)
Petrobras
4196/2014
744-745
748-750
-
ANP
4725/2014
789-790
850-852
-
Petrobras
4781/2014
805-806
812-842
31-66
(restrito Cade, Comgás e Petrobras)
Fonte: elaboração própria a partir de informações dos autos.

10.           Por fim, foram recebidas manifestações espontâneas da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (“Abegás”), às fls. 705-6 e 783-7, da própria Representante, no documento SEI nº 0015759, que trouxe aos autos dois pareceres econômicos opinando sobre a suposta conduta alvo de denúncia, e da Representada, nas manifestações SEI nº 0041134 e SEI nº0063200.
11.           É o relatório.

12.           O presente inquérito busca investigar indícios de conduta anticoncorrencial unilateral consistente em discriminação de preços e condições de contratação supostamente empreendida pela Petrobras no mercado de distribuição de gás canalizado. A presente Nota Técnica trata das conclusões obtidas em fase de inquérito administrativo para fins de arquivamento do feito ou de instauração de Processo Administrativo, nos termos dos artigos 67 e 69 da Lei nº 12.529/2011. Para tanto, passa-se a fornecer contextualização mais detalhada do caso (seção 2.1), para depois empreender a definição dos mercados relevantes (seção 2.2), a descrição da conduta investigada como ilícito concorrencial (seção 2.3) e os indícios que fundamentam a recomendação final desta SG de instauração de Processo Administrativo (seção 2.4, que traz análise de poder de mercado; seção 2.5, que estuda a possibilidade de prejuízo à concorrência; e seção 2.6, que investiga a existência, as motivações e a justificativa para a suposta conduta discriminatória).

2.1. Contexto e objeto do caso
13.           Devido ao histórico de negociação contratual e política comercial da Petrobras, assim como de formação do setor de gás natural no Brasil, existe hoje uma série de modalidades diferentes de contratos de fornecimento de gás natural.
14.           O setor termelétrico possui algumas especificidades e tem um modelo de contrato próprio, com preço privilegiado. Visto que tais contratos não são objeto da denúncia e que esse setor opera com dinâmica distinta das outras formas de consumo (industrial, residencial, automotivo etc.), esta SG optou por não incluir tais contratos na presente análise.
15.           Para os demais setores, atualmente o consumo se dá, em regra, através da malha de distribuição[1] por meio de contrato firmado entre o cliente final e a própria distribuidora, cujo preço é sujeito à regulação estadual. Os preços de fornecimento que a distribuidora contrata com a Petrobras também podem estar sujeitos à aprovação do ente regulador estadual, a depender do estado. Antes de 2007, havia duas modalidades básicas para uma distribuidora adquirir gás: alguns estados eram abastecidos pelo gasoduto Bolívia-Brasil e contratavam o produto com o preço do gás boliviano (chamados “contratos TCQ”[2]), enquanto outros estados estavam conectados a demais gasodutos e contratavam o gás ao preço do gás nacional (chamados “contratos de gás nacional”). Assim, havia duas modalidades contratuais básicas e a possibilidade de utilizá-las estava sujeita à localização geográfica da distribuidora local, sendo os preços diretamente relacionados às diferenças nos respectivos custos de produção.
16.           A partir de 2007, a Petrobras decidiu unificar a sua política comercial para as distribuidoras sob uma única modalidade contratual básica, denominada Nova Política de Preços (NPP), o que representou uma mudança significativa nos mecanismos de precificação.
17.           Anteriormente, a fórmula de cálculo dos preços no contrato era composta por duas variáveis, uma referente ao custo da molécula de gás e outra referente ao custo do transporte. Assim, o gás proveniente do produtor boliviano tinha um custo de molécula diferente do gás proveniente do produtor nacional, o que refletia no preço repassado pela Petrobras às distribuidoras. Ainda, cada distribuidora pagava um preço de transporte que refletia a distância percorrida pelo gás. Desta forma, o preço dos contratos estava atrelado à origem do gás.
18.           O advento da NPP ocorreu de forma concomitante aos esforços de integração da malha dutoviária nacional de transporte por parte da Petrobras e a construção de terminais de importação de gás natural liquefeito (“GNL”) associados a estações de regaseificação. Com isso, a Petrobras passou a organizar a oferta por gás canalizado de toda a malha integrada segundo uma lógica postal, na qual os estados localizados a distâncias maiores das regiões produtoras e/ou importadoras têm o custo de transporte subsidiado. Isso foi viabilizado por uma mudança na fórmula contratual de precificação: na NPP, a parcela da molécula e a parcela de transporte não são utilizadas, dando lugar a uma parcela fixa e outra variável, que são mais flexíveis para que a Petrobras aplique a política postal de preços.
19.           Ocorre que, à época da NPP, as distribuidoras já possuíam contratos em vigor com a Petrobras. Assim, seria necessário esperar tais contratos perderem a vigência ou rescindi-los para migrar o volume já contratado para a NPP.
20.           A Comgás celebrou um contrato TCQ com a Petrobras em 1996. Tal instrumento foi uma das maneiras de viabilizar a própria construção do gasoduto Bolívia-Brasil e, também por isso, foi constituído como contrato de longo prazo, com vigência até 2019. Posteriormente, para contratar um volume adicional de gás depois de 2007, a Comgás celebrou, ainda, contrato NPP com a Petrobras. Dessa forma, o preço final da Comgás é formado a partir de um mix entre os contratos NPP e TCQ que ela atualmente possui. A GBD, por sua vez, contrata todo o seu fornecimento de gás por meio da NPP desde o mês de dez 2012.
21.           Na denúncia oferecida, a Comgás alega que a Petrobras iniciou, em abril de 2011, uma política de descontos somente nos contratos NPP, beneficiando distribuidoras verticalmente integradas para as quais a NPP tem maior peso no mix, em especial a GBD. Em razão disso, o preço do mix da Comgás estaria mais caro que o das distribuidoras integradas sem justificativa legítima, o que estaria lhe causando prejuízo. Tais alegações constituem o objeto de investigação do presente caso.
22.           Antes de adentrar na análise de mérito, cumpre ressaltar que a argumentação das partes trouxe aos autos demandas judiciais e arbitrais de natureza privada. A Petrobras entende que a demanda judicial [3] (AUTOS RESTRITOS AO CADE, À COMGÁS E À PETROBRAS) poderia se confundir com a denúncia do presente caso. Segundo a Representada, a Comgás teria a mesma causa de pedir nos dois processos, alegando violação da Lei nº 12.529/2011 e requerendo a aplicação isonômica de descontos perante ambos o Cade e a Justiça. Naquela ação, o juiz ordenou que o Cade se manifestasse a respeito de seu interesse em integrar a lide. Visto que o Cade não teve interesse em integrar a lide naquele momento, pois teria considerado seu objeto como matéria privada, a Petrobras “postula que haja definição prévia por parte do Cade em relação ao caráter privatista ou publicista do assunto e, como consequência, decida pelo arquivamento imediato do presente inquérito ou a participação do Cade como Assistente na lide movida pela COMGÁS no TJ/RJ” (fl. 296).
23.           Nos dois processos, (ACESSO RESTRITO CADE, COMGÁS E PETROBRAS). Entretanto, observa-se que o principal fundamento para o pedido formulado perante o Judiciário é (ACESSO RESTRITO CADE, COMGÁS E PETROBRAS), diferentemente do principal fundamento ora utilizado perante o Cade, de infração da ordem econômica. De fato, o pedido do processo originário na Justiça consiste expressamente no (ACESSO RESTRITO CADE, COMGÁS E PETROBRAS), conforme se depreende do pedido exordial formulado à fl. 28 daquele feito. Por esses motivos, em petição de 13 de junho de 2014 naqueles autos, o Cade entendeu que o processo judicial em questão não parecia ter como objeto a discussão de valores difusos e coletivos, concluindo que naquele momento não tinha interesse em integrar a lide, com fundamento no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 12.529/2011.
24.           Em 4 de outubro de 2014, a Petrobras formulou pedido à Procuradoria Federal Especializada junto ao Cade (“ProCade”) por meio de memorial, cuja cópia foi juntada ao presente processo como SEI nº 0068663, em que solicita o ingresso do Cade para integrar a lide no Judiciário. Naquela peça, a Petrobras em nenhum momento fundamenta seu pedido como um imperativo ou condição sine qua non para o prosseguimento do presente inquérito administrativo, mas apenas como algo desejável do ponto de vista técnico, considerando que, em seu entendimento, a causa de pedir remota da Comgás nos processos judiciais seria uma infração da ordem econômica. Nota-se, portanto, postura contraditória da Representada ao demandar, no presente processo, o arquivamento do feito caso o Cade não demonstre interesse em integrar a lide judicial.
25.           A SG entende que não existe nenhuma obrigação legal de o Cade, para que possa proceder à investigação de uma infração da ordem econômica, se manifeste judicialmente acerca de danos privados causados por tal infração. Pelo contrário, a atuação do Cade como órgão judicante administrativo independe de sua atuação enquanto parte em processos judiciais, não sendo uma requisito da outra. Portanto, a abertura de Processo Administrativo para Imposição de Sanções Administrativas por Infrações à Ordem Econômica, nos termos do art. 69 da Lei nº 12.529/2011, prescinde de intervenção judicial por parte do Cade.
26.           Além disso, tendo em vista que o Cade não proferiu decisão com trânsito em julgado na esfera administrativa, não existe posicionamento definitivo da autarquia acerca da existência ou não da conduta infratora no presente caso, muito menos de dano privado dela decorrente. Decorre que a conclusão da investigação em seara administrativa serve também para informar o Cade da eventual necessidade de intervir judicialmente para proteger direito difuso e coletivo. Por isso, é prática padrão do Cade evitar integrar lides sobre supostas infrações cuja investigação ainda pende de conclusão. Assim, a SG considera que o pedido formulado pela Representada requerendo, alternativamente, ou o arquivamento do presente inquérito, ou a decisão do Cade de integrar a lide nos mencionados processos judiciais não deve ser acatado.
27.           Conclui-se que a presente investigação se volta a apurar a existência de infração da ordem econômica, o que não se confunde com danos privados decorrentes das práticas comerciais objeto dos mencionados litígios, práticas essas que podem ou não vir a ser consideradas condutas anticompetitivas por esta autarquia. Ressalta-se, por fim, que o Cade pode vir a decidir integrar a lide naqueles processos por fundamentos diversos aos apresentados pela Petrobras no presente processo, tais como a conclusão da presente investigação, a conveniência de dar suporte técnico especializado para a cognição do Judiciário, entre outros motivos com fundamento na lei.

2.2. Mercado relevante
28.           A cadeia do gás natural é dividida em três níveis. O nível upstream abrange desde a exploração de áreas viáveis de extração até a produção e o escoamento a refinarias, ou, alternativamente, a importação. O midstream compreende o processamento e o transporte em dutos de alta pressão. Por fim, o downstream consiste na distribuição local de gás através de dutos de média e baixa pressão ou de caminhões de gás liquefeito (GNL) ou comprimido (GNC).[4]
29.           Na dimensão produto, a conduta investigada estaria sendo perpetrada a partir do mercado midstream de transporte, a montante, até o mercado de distribuição, a jusante. Assim, os mercados relevantes na dimensão produto são definidos como o transporte e a distribuição de gás canalizado.
30.           Além desses mercados, é importante notar que existem combustíveis relativamente substitutos ao gás natural igualmente utilizados em processos caloríficos e energointensivos. Tais combustíveis podem genericamente consistir em diversas fontes de transformação de algum tipo de energia em energia térmica, tais como lenha, biomassa, combustíveis fósseis e até mesmo energia elétrica. Os substitutos mais próximos ao gás natural em termos concorrenciais são o óleo combustível e o gás liquefeito de petróleo (“GLP”).[5] Portanto, apesar de se adotar aqui a dimensão produto tradicional de transporte e distribuição de gás natural, a SG entende que devem ser considerados, ainda, as implicações concorrenciais geradas pela participação da Representada nas indústrias de combustíveis substitutos, conforme será feito na seção 2.4 adiante.
31.           Na indústria do gás natural, de um lado, a cadeia de produção tem etapas que podem, em tese, funcionar em ambiente concorrencial menos regulado, mais conformado pela livre concorrência, como a produção, a comercialização e o consumo. De outro, nas etapas relevantes ao presente processo é possível vislumbrar uma conformação de mercado mais típica de monopólios naturais, em virtude do alto custo fixo de construção dos dutos, do baixo custo marginal de fornecimento após a implantação do duto e dos ganhos de escala e de rede decorrentes.[6] Em razão disso, tais atividades são reguladas no Brasil.
32.           Por força da Constituição Federal (art. 25, §2º), a distribuição de gás canalizado é considerada serviço público de competência dos estados, que costumam explorar a atividade por meio de empresas estatais sob seu controle, constituídas para esse fim, ou através de chamamento ou licitação para outorga da atividade a empresas privadas. Uma vez garantida a concessão, a distribuidora detém exclusividade sobre a prestação desse serviço na respectiva área de concessão e tem sua atividade, inclusive o preço, regulada pelo estado federado. Alguns estados possuem agências reguladoras próprias, separadas da administração estadual (ex.: SP e RJ).
33.           Por sua vez, a atividade de transporte canalizado de gás é regulada em nível federal pela ANP. Até 2009, vigoraram as determinações da Lei nº 9.748/1997 (Lei do Petróleo), cujo regime foi bastante alterado pela Lei nº 11.909/2009[7] (Lei do Gás), conforme o quadro abaixo:

Quadro 1 – Quadro comparativo entre os marcos regulatórios do transporte de gás
Aspecto regulatório
Lei do Petróleo (1997)
Lei do Gás (2009)
Regime de outorga
Autorização
Concessão (30 anos)*
Novos gasodutos
Livre iniciativa de agentes do mercado
Propostos pelo MME
Contratos de transporte
Enviados à ANP até 15 dias após assinatura
Previamente aprovados pela ANP
Tarifas de transporte
Negociada entre as partes
Estabelecida ou aprovada pela ANP
Acesso de terceiros
Negociado entre as partes
Regulado pela ANP
Importação e exportação
Autorizadas pela ANP
Autorizadas pelo MME
Estocagem
Não contemplada
Concedida ou autorizada
Atividade de comercialização
Não contemplada
Aprovada pela ANP
* Autorização para alguns casos específicos.
† Aprovada apenas para o caso de gasodutos autorizados.
Fonte: ANP.[8]

34.           A linha divisória entre o transporte e a distribuição são os city gates, que consistem em mecanismos instalados nos dutos de alta pressão (transporte) permitindo a medição e a transferência para dutos de média e baixa pressão (distribuição). Nesse ponto, esgota-se também a competência da ANP e passa a vigorar a regulação estadual.

2.2.2. Mercado relevante geográfico
35.           No Brasil, existem duas redes principais de dutos de transporte: a rede da região Norte (AM) e a rede interligada das regiões Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul. Embora seja possível pensar a delimitação geográfica do mercado relevante nesses termos, ou até mesmo mais localizados, considerando a direção do fluxo de gás nos dutos e a sua capacidade de transporte, entende-se que, para o presente caso, esse aprofundamento é desnecessário. Isso se deve a dois fatores principais: (i) a eventual conduta surtiria efeitos anticompetitivos apenas no mercado de distribuição a jusante, no qual a integração de malhas interestaduais para fins de transporte é considerada bypass regulatório e, em regra, proibida;[9] (ii) a Petrobras é praticamente monopolista no mercado brasileiro de transporte de gás, sendo indiferente o recorte geográfico para a montagem da estrutura de oferta de transporte no presente caso. Assim, tendo em vista que a Petrobras atua em âmbito nacional e que o mercado de transporte também tem abrangência interestadual e inter-regional, adota-se aqui a definição de mercado relevante sob a dimensão geográfica nacional, com a ressalva de que outras definições podem servir melhor a casos futuros.
36.           Quanto ao mercado de distribuição, devido à exclusividade de atuação de cada concessionária no respectivo território, o Cade tradicionalmente definia o mercado relevante geográfico como a área de concessão da distribuidora.[10] Nesses termos, não é possível haver competição entre distribuidoras, pois a atuação de uma jamais poderia se estender à área de concessão de outra, em virtude da exclusividade prevista.
37.           Entretanto, novos elementos de discussão e análise foram trazidos pelo julgamento do AC nº 08012.006171/2010-03[11] (“AC GBD”), que consistiu na aquisição, por parte do Grupo Petrobras, da distribuidora de gás canalizado Gás Brasiliano Distribuidora S.A. (GBD). O Conselheiro-Relator do caso, Olavo Chinaglia, em voto aprovado por unanimidade pelo Tribunal do Cade, vislumbrou a possibilidade de uma interação competitiva entre as distribuidoras na atração de grandes consumidores industriais. Em outras palavras, no entender do ex-Conselheiro existiria uma competição potencial entre as concessionárias que estão em localidades distintas, no momento de convencer a potencial cliente a se instalar na sua região em vez de se fixar na região de outra concessionária. De fato, as preocupações concorrenciais com a integração vertical e os incentivos para discriminação de outras distribuidoras foram graves o suficiente para impor restrições à aprovação daquela operação.
38.           Esse tipo de competição pode ser especialmente relevante pelo fato de que, uma vez que a cliente se instala em determinada localidade, ela incorre em custos de troca substanciais para mudar de fornecedora, pois a exclusividade territorial do serviço de distribuição canalizada implica que a cliente deve deslocar geograficamente toda sua estrutura fabril, incluindo possivelmente a base operária, contratos de logística e fornecimento, capital físico etc., o que pode envolver, ainda, substanciais custos afundados. Além disso, tendo em vista que esse custo de troca pode se acentuar em função da distância geográfica, é plausível que exista um incentivo para discriminação mesmo considerando concessionárias concorrentes afastadas.
39.           Em virtude dessa preocupação, na ocasião do AC nº 08700.006668/2014-99[12] (“AC Cemig-GNF”), em que se analisou a formação de joint venture entre a Companhia Energética de Minas Gerais e a Gás Natural Internacional, SDG, S.A. (do Grupo Gás Natural Fenosa) para a participação acionária conjunta em quatro distribuidoras de gás canalizado, esta SG considerou oportuno fazer uma instrução mais aprofundada quanto à possibilidade de existir alguma interação competitiva entre as distribuidoras.
40.           Naquele processo, foram colhidas respostas a ofícios enviados a distribuidoras, agências reguladoras e grandes consumidoras de gás que confirmaram a existência de algumas dimensões possíveis de competição entre as distribuidoras, a despeito da exclusividade territorial. As principais dimensões observadas são: (i) competição pelo mercado (no momento do chamamento ou da licitação pública); (ii) atração de consumidores industriais (influência na decisão alocativa de indústrias consumidoras de gás através da capacidade de ofertar preços menores ou outras condições contratuais mais favoráveis); e (iii) por meio da regulação (entidade reguladora observa comportamento mais eficiente de outras distribuidoras e impõe prática semelhante às distribuidoras por ela reguladas).
41.           Dentre os principais fatores que determinam a existência de tais interfaces de competição, podem-se citar, em resumo:
                                                 i.                   Quanto à competição pela atração de grandes consumidoras: (i) o fato de muitas indústrias analisarem a competitividade do insumo no país como um todo, afirmando que o preço do gás está caro em todo o território e que não existe, hoje, uma região específica no Brasil onde o preço do gás favoreceria sua instalação ou a expansão de sua linha de produção, mas sim que seria mais favorável escolher regiões fora do país; e (ii) o fato de que outros elementos importantes para a decisão alocativa de empresas consumidoras de gás não estão restritos aos limites da área de concessão (por vezes nem mesmo a limites estaduais ou regionais).[13]
                                                ii.                   Quanto à competição pelo mercado nas licitações e chamamentos públicos, cada estado tem liberdade para estabelecer os critérios exigidos às licitantes, mas esses critérios não discriminam as empresas por região do país. De fato, é comum a constituição de Sociedade de Propósito Específico para disputar as licitações, o que a princípio pode ser feito por qualquer agente nacional ou internacional. As exigências costumam ser associadas à experiência técnica e capacidade financeira.
                                              iii.                   Quanto à competição por meio do modelo regulatório, as agências reguladoras podem tanto selecionar entre as práticas mais eficientes de cada distribuidora da sua área de concessão (como no estado de São Paulo, em que há mais de uma distribuidora), caso em que a concorrência seria estadual, quanto observar as práticas de distribuidoras em outras áreas quaisquer do país, caso em que a concorrência seria regional ou nacional.

42.           Considerando esses indícios, a análise naquele AC optou por trabalhar com diferentes cenários de mercado relevante geográfico. Visto que alguns indícios adicionais colhidos no presente processo se alinharam aos daquele AC, conforme ficará demonstrado ao longo do presente documento, o mesmo procedimento será adotado aqui, com cenários de mercado relevante geográfico que serão analisados em mais detalhes no tópico 2.4 adiante, em que se analisará o poder de mercado da Representada. Antes disso, faz-se necessário revisar os fundamentos teóricos e jurisprudenciais da ilicitude da conduta investigada, o que será feito no tópico 2.3 a seguir.

2.3. Tratamento discriminatório como conduta anticompetitiva
43.           De início, cumpre observar que a discriminação de preços ou de condições de contratação não é, necessariamente, ilícito antitruste. Com efeito, trata-se de comportamento corriqueiro no mercado, motivado por várias razões de ordem prática e econômica, sendo, na maioria das vezes, conduta legítima.
44.           Isso ocorre porque é comum haver situações em que agentes econômicos desiguais são tratados de maneira desigual. Como exemplo, cita-se a prática de descontos por volume consumido ou para determinado perfil de consumidores (como os descontos para entradas de cinema para estudantes e idosos).[14] Da mesma forma, a discriminação de preços ou condições de contratação em razão de níveis muito díspares de consumo pode resultar de economias de escala, ocasionando ganhos de eficiência com a cobrança de preços menores de consumidores que contratam volumes maiores. Outro exemplo ocorre quando o custo marginal de fornecimento de um serviço aumenta significativamente em certos intervalos de tempo, como em períodos de pico, fazendo com que a cobrança de preços diferenciados constitua prática eficiente.[15]
45.           A discriminação de preços ou de condições de contratação pode ser ilícito concorrencial quando a fornecedora utiliza seu poder de mercado para fixar preços diferentes para o mesmo produto ou serviço, discriminando-os entre clientes, de forma a prejudicar a livre concorrência.[16] Conforme voto do Conselheiro-Relator Carlos Ragazzo no Processo Administrativo nº 08012.001099/1999-71[17]:
A discriminação de preços pode ser caracterizada como a venda de um mesmo produto a diferentes clientes sob diferentes condições sem justificativa para tanto. Em termos econômicos, poderia ser caracterizado como a capacidade de um agente em extrair o máximo da disposição de pagamento de seus diferentes consumidores por um determinado bem.

46.           Assim, há de se atentar para diversas questões relevantes quando da delimitação da discriminação de preços, como (i) a contemporaneidade das diversas vendas, (ii) a similaridade dos produtos e serviços, (iii) a categoria de compradores, (iv) a localização geográfica do comprador, (v) a quantidade adquirida e (vi) outros fatores justificadores de diferenciação de preços.[18]
47.           Para que a discriminação de preços ou de condições contratuais se configure ilícito antitruste, é necessário que: (i) o agente econômico discriminador possua posição dominante no mercado relevante de origem; (ii) haja prejuízo, ainda que potencial, à livre concorrência; e, (iii) não existam justificativas objetivas para a prática que demonstrem racionalidade econômica legítima na conduta. Passa-se à apuração de indícios com relação a esses três pontos (respectivamente, seções 2.4, 2.5 e 2.6)

2.4.Poder de mercado
48.           Na seção 2.2 acima, definiu-se como dimensão produto os mercados de transporte e distribuição de gás natural. Colocou-se, ainda, que a existência de produtos relativamente substitutos ao gás natural impõe a necessidade de levar em consideração as implicações concorrenciais não somente da participação da Representada em gás natural, mas também nos mercados de óleo combustível e GLP.
49.           Na presente seção, cumpre averiguar se a Representada possui participação relevante nesses mercados e, em caso afirmativo, se há incentivo para que ela exerça poder de mercado no sentido de adotar a conduta ora investigada. Em síntese, o objetivo da análise de poder de mercado é averiguar se a Petrobras tem poder suficiente nos mercados aqui considerados para que lhe seja desejável prejudicar a Comgás e beneficiar suas empresas integradas.
50.           Quanto ao mercado de transporte de gás natural, em sua dimensão geográfica nacional tal como adotada na seção 2.2 acima, a Petrobras é praticamente monopolista, controlando todos os trechos da malha integrada brasileira.[19] Em reunião do dia 27 de outubro de 2014, representante da Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro (“Abividro”) afirmou que, apesar de haver outras produtoras de gás natural no país e no exterior, nenhuma delas se coloca como ofertante no mercado, pois apenas a Petrobras detém os dutos de escoamento, as refinarias e os dutos de transporte, colocando-se como o único agente que negocia com as distribuidoras de fato. Isso atesta o poder de mercado da Representada no segmento de transporte. Considerando as características de rede e infraestrutura desse mercado, com baixa flexibilidade entre os elos da cadeia e altos custos afundados e economias de escala, evidencia-se, ainda, o poder de barganha da Representada frente às distribuidoras locais.
51.           Se, por um lado, a posição dominante da Representada no mercado a montante é inequívoca, por outro, tal constatação não é por si só suficiente para demonstrar a existência de incentivos à discriminação anticompetitiva. Como transportadora, a Petrobras não compete, em princípio, com as distribuidoras locais, pois mantém com elas uma relação vertical. Caso a Petrobras não detenha participação relevante nos mercados em que efetivamente há concorrência com a Comgás, não é possível evidenciar poder de mercado ou incentivos para a prática investigada. Assim, faz-se necessário investigar, em primeiro lugar, com quem as distribuidoras a jusante competem, para poder então mensurar a participação da Representada nas concorrentes da Comgás.
52.           Conforme colocado na seção 2.2, no mercado de distribuição, a concessionária local pode competir:
                                                 i.                   Com empresas que comercializam energéticos substitutos;
                                                ii.                   Com outras empresas que distribuem gás natural.

53.           Os energéticos substitutos podem variar em grau de substitutibilidade, conforme a atividade econômica considerada, sendo os principais deles o óleo combustível e o GLP. Conforme colocado na seção 2.2 acima, apurou-se que a Petrobras detém forte participação no mercado de óleo combustível e participação no mercado de gás liquefeito de petróleo.[20]
54.           Além disso, conforme será detalhado na seção 2.6.2.1 abaixo, a justificativa dada pela Representada para a prática de descontos ora investigada é a manutenção da competitividade do gás natural em relação ao óleo combustível. Nesse contexto, existe o incentivo para que a Petrobras deixe de conceder descontos às concessionárias não integradas de gás, sabendo que isso pode prejudicá-las frente ao óleo combustível, mercado em que a Petrobras também detém forte participação, dessa forma protegendo apenas as concessionárias integradas.
55.           Assim, considerando-se somente a dimensão de competição entre o gás natural e combustíveis substitutos, a SG entende que existe incentivo para que a Representada adote tratamento discriminatório de modo a exercitar seu poder de mercado para favorecer suas operações nos mercados de combustíveis substitutos em detrimento da Representante.
56.           Já na interação entre a concessionária local de gás canalizado e outras empresas de gás natural, é possível haver pelo menos duas interfaces de competição: (i) entre a concessionária local e uma distribuidora de gás a granel[21] e (ii) entre a concessionária local e uma concessionária de outra região.[22]
57.           A Petrobras possui participação no mercado de distribuição de gás a granel via GNL por meio da empresa GásLocal, no âmbito do Consórcio Gemini. A planta da GásLocal se localiza em Paulínia, SP, município da área de concessão da Comgás. Visto que o raio de atuação típico do GNL terrestre no Brasil é 1000 km, a GásLocal tem capacidade para atuar em todo o território do estado de SP e, portanto, em toda a área de concessão da Comgás. Ressalta-se que a possibilidade de haver tratamento discriminatório anticompetitivo no fornecimento de gás natural em favor do Consórcio Gemini e em detrimento da Comgás é objeto de processo específico no Cade (PA nº 08012.011881/2007-41) e não constitui objeto do presente processo. Não obstante, serve a reforçar o incentivo à discriminação que a Petrobras possui no fornecimento de gás natural a distribuidoras não integradas.
58.           Apesar dos incentivos à discriminação até agora relatados, é certo que o foco da presente investigação reside nos incentivos para discriminação entre a concessionária local (Comgás) e concessionárias de outras regiões. Conforme foi colocado na seção 2.2, o Cade recentemente passou a admitir a possibilidade de competição entre concessionárias de regiões diferentes. Nesse sentido, considerando a posição dominante da Petrobras no mercado a montante (transporte) e a jusante (distribuição), os principais incentivos para discriminação anticompetitiva estão direcionados ao favorecimento de concessionárias integradas nas dimensões competitivas mencionadas na seção 2.2 acima (atração de novas consumidoras, licitações públicas e modelo regulatório). Em especial, considerando que uma vez instaladas as clientes enfrentam custos substanciais para trocar de concessionária, pois isso envolve o deslocamento geográfico da estrutura de produção, não se descarta que a competição pela atração de novas clientes forneça os incentivos mais pronunciados para eventual discriminação. Ademais, tendo em vista que esse custo de troca aumenta em função da distância entre as concessionárias, o incentivo pode persistir mesmo para concessionárias concorrentes que se localizam em áreas afastadas uma em relação à outra.
59.           Apesar da concretude de indícios que apontam para a existência de tais incentivos, ainda não há definição geográfica sedimentada na jurisprudência do Cade quanto à competição entre concessionárias. Por esse motivo, optou-se por seguir aqui os mesmos cenários trabalhados no mencionado AC GBD, adicionando-se o cenário estadual. Tais cenários estão relacionados abaixo:
                                                 i.                   Cenário local: abrange apenas a área de concessão definida pelo ente estadual outorgante, território em que a distribuidora detém monopólio sobre a operação dos dutos de distribuição. Trata-se do cenário tradicionalmente utilizado pelo Cade até o julgamento do AC nº 08012.006171/2010-03. No caso, o território em questão é a área de concessão da Comgás;
                                                ii.                   Cenário estadual: o cenário estadual não foi analisado no AC Cemig-GNF porque aquela operação era relativa à distribuidora de Minas Gerais, estado que possui apenas uma área de concessão abrangendo todo seu território. Entretanto, no estado de São Paulo existem três áreas de concessão, cada uma explorada por um grupo diferente (v. figura 1 abaixo). No presente processo, há dois indícios que apontam para a necessidade de análise do cenário estadual: a concorrência entre práticas a serem mimetizadas por força da regulação[23] e o fato de as áreas serem contíguas, com significativa integração logística e proximidade dos mesmos mercados consumidores e insumos necessários a algumas indústrias (ex.: argila, necessária à indústria cerâmica). A Comgás alega, ainda, que haveria clientes estudando a possibilidade de migrar ou de expandir para áreas limítrofes dentro de SP, pertencentes à GBD, caso a diferença de preços entre as regiões fosse mantida por mais tempo (fls. 402/403 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Comgás);
                                              iii.                   Cenário regional: em confluência com a análise do cenário estadual, é possível supor, em tese, que algumas variáveis importantes na decisão alocativa das indústrias estariam presentes em áreas de concessão próximas ou contíguas, tais como infraestrutura logística, proximidade da matéria-prima e/ou do mercado consumidor, entre outros, em linha com alguns dos indícios apresentados para o cenário estadual. Assim, por precaução, será considerado aqui o cenário regional, definido como a Região Sudeste. Em termos percentuais, tem-se a seguinte estrutura de mercado;
                                              iv.                   Cenário nacional: a competição pela atração de grandes consumidoras industriais pode não estar adstrita somente a uma lógica estadual ou regional, mas também nacional. Nesse sentido, algumas das principais indústrias consumidoras de gás natural dependem de recursos naturais e outros fatores importantes para sua decisão alocativa que estão presentes em diferentes regiões do Brasil.[24] Ainda, tendo em vista o porte das empresas do setor analisado, é plausível supor que a competição pelo mercado para licitações de concessão se dê em dimensão nacional.

Figura 1 – Áreas de concessão de distribuição de gás natural canalizado no Estado de São Paulo

Fonte: Secretaria de Energia do Estado de São Paulo.

60.           Passa-se à análise da estrutura de mercado em cada cenário para avaliação de poder de mercado da Representada.
61.           Considerando que a concessionária tem exclusividade legal de prestação de serviços de gás canalizado em determinado território, uma concessionária não pode atuar na área geográfica da outra. Portanto, a Comgás detém 100% de participação de mercado em distribuição de gás natural canalizado no cenário local. Decorre que a Petrobras não possui participação em gás natural canalizado nesse cenário e, portanto, não existe incentivo ou possibilidade para discriminação entre concessionárias. Ressalta-se, no entanto, que continuam existindo os incentivos para discriminação advindos da participação da Petrobras em GNL e combustíveis substitutos, o que é especialmente relevante quando se leva em consideração as justificativas da Representada para a conduta investigada, de competitividade perante o óleo combustível, e sua elevada participação nesse mercado, conforme já mencionado na presente seção.
62.           A partir exclusivamente do cenário local, seria possível argumentar que a ausência de poder de mercado na distribuição canalizada e a presença apenas de incentivos relacionados a produtos relativamente substitutos não prestariam robustez suficiente de indícios para a instauração de processo administrativo. Ainda que se entenda dessa forma, é necessário considerar que o cenário local não oferece uma compreensão satisfatória do mercado de distribuição de gás canalizado, conforme restou claramente consignado nos precedentes mais recentes do Cade apresentados na seção 2.2 da presente nota técnica. Portanto, o fato de a análise tradicional não detectar participação da Representada em gás canalizado no cenário local não é suficiente para atestar a ausência de possibilidade de exercício de poder de mercado. A existência de competição entre concessionárias implica que os indícios relativos aos cenários ampliados (estadual, regional e nacional) são no mínimo tão relevantes quanto, senão mais, para a investigação desse aspecto.
63.           A tabela abaixo traz a estrutura de mercado em volume de gás vendido, considerando janeiro a julho de 2014, dos três cenários ampliados: [25][26][27][28]

Tabela 2 – Participação no mercado de distribuição de gás natural canalizado em volume vendido para cenários estadual, regional e nacional (jan. a jul. 2014)
Cenário estadual
Cenário regional
Cenário nacional
Comgás
88,2%
Comgás
30,6%
Comgás
19,3%
Sistema Petrobras (GBD)
4,6%
Sistema Petrobras (GBD, Gasmig, BR e CEG-Rio)
38,1%
Sistema Petrobras (todas as demais)
56,5%
Grupo Gás Natural Fenosa (SPS)
7,2%
Grupo Gás Natural Fenosa (SPS, CEG)
31,4%
Grupo Gás Natural Fenosa (SPS, CEG)
19,8%
-
-
-
-
Cigás
4,4%
-
-
-
-
MTGás
0,0%
Total
100%
Total
100%
Total
100%
Fonte: Abegás.

64.           Observa-se, de início, que quanto mais ampliado é o cenário, maior é a participação de mercado da Representada. Os cenários regional e nacional não deixam dúvidas quanto à presença de incentivos à discriminação anticompetitiva, sendo que a Petrobras teve participação de, respectivamente, 38,1% e 56,5% do volume total vendido. Cumpre lembrar que a Petrobras detém participação relevante em todas as distribuidoras de gás em operação do país, à exceção das distribuidoras MTGás (MT), Cigás (AM), SPS (região sul de SP), CEG (interior do RJ), Comgás e, desde o final de 2014, Gasmig (MG). A SG entende, portanto, que para esses dois cenários existem indícios robustos e conclusivos a denotar o risco de exercício abusivo efetivo da posição dominante da Representada no sentido de praticar a conduta investigada.
65.           Quanto ao cenário estadual, observa-se que a Representada deteve participação reduzida em volume vendido (4,6%), sendo o menor player do território. Tal fato, isoladamente, constitui indício de que não haveria incentivo ou possibilidade de a Representada exercer poder de mercado no sentido de praticar a discriminação anticompetitiva ora investigada.
66.           É necessário considerar, porém, que a Comgás se localiza em região cujo mercado de gás canalizado encontra-se em estágio maduro de desenvolvimento. De fato, é a região com maior concentração de indústrias do país, abrangendo as regiões metropolitanas de São Paulo (capital), Campinas e Baixada Santista (v. figura 1 acima). A rede local se encontra bem desenvolvida em termos de extensão e de clientes captados. Por seu turno, a GBD se situa no interior (noroeste) do estado e detém outorga sobre território em estágio ainda inicial de desenvolvimento, sendo praticamente um empreendimento greenfield quando do início da concessão.
67.           As tabelas a seguir evidenciam a evolução do cenário estadual em volume de gás vendido e em extensão de rede. Note-se que as participações em volume permaneceram relativamente estáveis não obstante o fato de a Comgás ter investido muito mais em extensão de rede. Isso significa que a GBD consegue manter sua participação de mercado mesmo fazendo bem menos investimento que a Comgás, o que denota um mercado em estágio mais inicial e com maior potencial de crescimento.

Tabela 3 – Cenário estadual: evolução da participação de mercado em volume vendido (jan. 2010 a jul. 2014)
Concessionária
2010
2011
2012
2013
2014*
Comgás
86,5%
85,7%
86,9%
87,3%
88,2%
Sistema Petrobras (GBD)
4,2%
5,0%
5,0%
4,9%
4,6%
Grupo Gás Natural Fenosa (SPS)
9,4%
9,3%
8,2%
7,7%
7,2%
Total
100%
100%
100%
100%
100%
* Até julho.
Fonte: Abegás.

Tabela 4 – Cenário estadual: evolução da participação de mercado em extensão de rede (2010-2014)
Concessionária
dez/10
dez/11
dez/12
dez/13
jun/14
Comgás
77,4%
79,1%
80,9%
82,9%
83,8%
Sistema Petrobras (GBD)
7,7%
7,6%
7,3%
6,5%
6,3%
Grupo Gás Natural Fenosa (SPS)
14,9%
13,3%
11,9%
10,5%
10,0%
Total
100%
100%
100%
100%
100%
Fonte: Abegás.

68.           Isso indica que os dados referentes à participação atual, considerados isoladamente, podem deixar de revelar a presença de incentivos à discriminação caso seja analisado um cenário dinâmico. A SG entende plausível supor que capacidade de crescimento da empresa GBD, que poderia chegar a participações de mercado bem maiores com pouco investimento relativamente à Comgás, tem o condão de reforçar os incentivos à discriminação.
69.           Lembre-se que a Petrobras detém monopólio no mercado a montante assim como em combustíveis substitutos, o que implica incentivos já mencionados causados pela interação competitiva entre gás natural e combustíveis substitutos e entre gás canalizado e GNL. No conjunto, considerando todos os fatores até agora aludidos, a SG entende, em postura conservadora, que não se pode descartar a possibilidade de haver incentivos suficientes no cenário estadual para a discriminação investigada, muito embora os incentivos nesse sentido sejam menos evidentes que nos cenários regional e nacional.
70.           A presente seção avaliou se a Representada detém poder suficiente nos mercados a jusante (combustíveis substitutos, gás natural canalizado e GNL) para ter incentivos a prejudicar a Comgás e beneficiar suas próprias operações integradas. A partir da análise, concluiu-se inicialmente que existem incentivos nesse sentido quanto à presença da Representada nos mercados de GNL, GLP e, sobretudo, de óleo combustível, produto cuja competição com o gás natural é utilizada como justificativa para a conduta investigada, conforme se verá na seção 2.6.2.1. Concluiu-se, ainda, que tais incentivos são os únicos presentes quando se analisa o cenário local de competição, em que a Petrobras não possui participação em gás canalizado, fato que pode indicar a ausência de incentivos suficientes para ensejar a prática anticoncorrencial. Entretanto, outros incentivos também estão presentes nos cenários ampliados. Nos cenários regional e nacional, existe claro incentivo à discriminação anticompetitiva decorrente da alta participação da Representada nesse mercado (38,1% e 56,5%, respectivamente). Por fim, no cenário estadual, apesar de a Representada possuir pequena participação em distribuição canalizada (4,6%), observou-se que o potencial de crescimento da Petrobras é grande relativamente à Comgás, o que, em conjunto com sua participação em GNL e outros combustíveis, pode implicar incentivo suficiente para a prática da conduta investigada.

2.5. Possibilidade de dano à concorrência
71.           O preço final praticado pelas distribuidoras costuma ser um só para cada uma das diferentes faixas de clientes.[29] Esse preço é fixado pela regulação estadual e seus valores e componentes podem variar conforme a unidade da federação. Não obstante, a fórmula geral para o cálculo é o preço do gás adicionado à margem de distribuição.
72.           O preço do gás é a parcela que reverte à fornecedora — no caso, a Petrobras, que é monopolista no mercado a montante de transporte de gás. É composto pelo preço da molécula de gás adicionado ao custo do transporte.
73.           Já a margem de distribuição é aquela que reverte à distribuidora e que está sujeita à regulação estadual. Por vezes, a regulação estadual impõe um regime de tarifas teto (price cap), o que limita o repasse ao consumidor do custo do gás adquirido através do estabelecimento de uma tarifa máxima de venda do gás. Assim, se o gás adquirido por uma distribuidora é caro demais, sua margem de distribuição poderá ser menor caso o preço final ultrapasse o teto. Sem o regime de price cap, o preço cheio é repassado diretamente à clientela final.
74.           As observações da seção 2.2.2 acerca das interações competitivas possíveis entre distribuidoras implicam que alterações nos preços de aquisição do gás podem modificar a dinâmica competitiva ao influenciar a decisão alocativa de novas indústrias e/ou prejudicar a atuação das distribuidoras e sua capacidade de competir em investimentos e em licitações. Na ausência de regime de price cap, ou na hipótese de o preço praticado pelas distribuidoras estar abaixo do teto regulatório, a discriminação afeta diretamente a atração de novas consumidoras ao estabelecer, por meio do repasse do custo do gás, preços distintos à clientela final entre as diferentes regiões de concessão. Na presença de regime de price cap, caso o preço esteja no limite ou além do teto, o desempenho financeiro da distribuidora pode ser prejudicado por meio de compressão de margem, o que distorce sua capacidade de investimento em rede, de contratação de volume adicional de fornecimento de gás ou até mesmo de participar em novas licitações de distribuição de gás canalizado, além de poder interferir na qualidade de seu serviço. Portanto, a distribuidora que recebe o gás mais caro fica em desvantagem perante as outras com ou sem o regime de price cap.
75.           Especificamente para o estado de São Paulo, a ARSESP relata que a própria divisão do território paulista entre três concessionárias diferentes – e não apenas uma, como em todas as outras unidades da federação, à exceção do Rio de Janeiro – foi pensada para viabilizar a competição entre as diferentes concessionárias. In verbis:
[...] embora os serviços de distribuição apresentem características de monopólio natural, ao criar três áreas de concessão, controladas por empresas distintas, permitiu-se ao menos aos grandes consumidores, como indústrias e termelétricas, a opção de eleger seu prestador do serviço.
Dessa forma uma nova indústria, ao decidir sobre a localização de instalação de sua planta, poderá também considerar as condições, o preço e a qualidade dos serviços oferecidos pelas empresas concessionárias.
Além disso, do ponto de vista do Estado, a distribuição das concessões em três áreas distintas facilita também a regulação da prestação dos serviços por comparação de desempenho entre as diferentes concessionárias. (fl. 568)

76.           Dessa forma, a criação artificial de vantagem competitiva relativa favorecendo empresas integradas poderia ocasionar distorções também na lógica competitiva estadual.
77.           Além disso, foi possível colher indícios de prejuízo ao mercado consumidor. Inicialmente, constata-se que o contrato pelo qual o Estado de São Paulo outorga concessão à Comgás (fls. 61 e ss.) estabelece que a tarifa do gás a ser cobrada pela Comgás é obtida através da soma entre o preço de aquisição do gás (dado pela Petrobras) e a margem de distribuição regulada (revertida à Comgás). Ou seja, o preço de aquisição do gás é repassado diretamente à clientela final (“passthrough”) por força de regulação. Desse modo, um preço mais caro do insumo para a Comgás, em seu mix, por meio de descontos apenas no contrato NPP, resulta automaticamente em preço final mais caro para a base de clientes, o que poderia, em tese, trazer dano a grande parte dos segmentos do mercado consumidor (industrial, residencial, comercial, gás natural veicular).
78.           Ademais, foram trazidos aos autos indícios de dano especificamente ao segmento industrial a partir de comunicações expedidas por associações de empresas que utilizam o gás natural da Comgás como insumo (fls. 402 e 403 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Comgás). Os trechos a seguir ilustram as preocupações dessas empresas, corroboradas por representante da Abividro em reunião com esta SG de 27/10/2014 (fl. 811), endereçadas diretamente à Comgás:
Nossas associadas localizadas no estado de São Paulo estão sentindo dificuldades, tendo impactos em sua produção, por conta de o gás natural vendido pela COMGAS ter seu custo de gás superior àqueles praticados pela Gás Brasiliano Distribuidora (GBD) e, em outros lugares do país.
Através de informações do mercado verificamos que a GBD tem realmente um custo de gás menor do que o da COMGAS. Como é de seu conhecimento, o insumo gás é totalmente relevante para a produção de [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS] e essa situação nos traz uma série de impactos como: perda de competitividade, paralisação das atividades industriais, aumento do preço do produto, redução de produção, dentre outros tantos. (fl. 402, apartado de acesso restrito Cade e Comgás, relatado pela [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS])

Constatamos que as diferenças no custo do gás nas diversas regiões do país, em especial na região da COMGÁS (onde se localizam cerca de 65% dos produtores de [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS]), se comparada ao da GBD, ocasiona os seguintes malefícios para o setor:
(i) Perda de competitividade do [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS] brasileiro, se comparado ao seu similar importado;
(ii) Perda de competitividade entre indústrias [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS] de acordo com a localização geográfica da planta (e o seu respectivo custo de gás);
(iii) Diminuição do volume de gás natural consumido, em face da concorrência com outras indústrias de [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS] situadas em regiões ou países em que o custo de gás é menor;
(iii) Diminuição do volume de gás natural consumido em face da transferência da produção para outra(s) planta(s) em outras regiões nas quais o nível do custo de gás é menor (fl. 403, ibid., relatado pelo [ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS]).

79.           Com efeito, o dano à indústria decorrente da diferença NPP com desconto vs. TCQ parece ter sido suficiente para mobilizar o governo de São Paulo, conforme se depreende de notícia veiculada peloValor Econômico em 21/02/2014:
O governo paulista parece não ter conseguido sensibilizar a presidente da Petrobras, Graça Foster, a mexer nos preços do gás. Segundo o secretário de Energia do Estado de São Paulo, José Aníbal, a petrolífera informou que não vai mudar, por enquanto, a fórmula para calcular o custo do insumo que é fornecido às empresas instaladas no Estado de São Paulo. Aníbal e o governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, haviam pedido que o cálculo fosse revisto em um encontro com Graça Foster, há cerca de sete meses.
Mas, segundo Aníbal, a executiva respondeu, em janeiro, que não poderia atender à solicitação neste momento. As indústrias do Estado de São Paulo, assim como as instaladas na região Sul do país, são abastecidas em parte com gás natural vindo da Bolívia, cujo preço está atrelado ao dólar. Esse mix, entre gás boliviano e nacional, torna o produto mais caro que do que o gás fornecido pela Petrobras para outros Estados - do Rio de Janeiro para cima.
O governo paulista reivindica que os preços do insumo sejam unificados em todo território nacional, o que permitiria reduzir os custos em São Paulo, mas, em compensação, elevaria os preços em outros Estados. Anibal afirma que a defasagem - a diferença entre os preços pagos pelas empresas em São Paulo e em outros locais do país -, já estaria em torno de 15%.[30]

80.           No mesmo sentido dos indícios acima, a ARSESP coloca que “os usuários de gás canalizado, das demais áreas de concessão do Estado de São Paulo, [...] seriam os maiores prejudicados, caso houvesse a prática, pela GASPETRO, ou qualquer empresa do seu grupo econômico, de oferecimento de condições diferenciadas para GBD, em detrimento das outras duas concessionárias.” (fl. 261 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Petrobras)
81.           A partir do exposto, conclui-se que há indícios robustos de que a alegada conduta ora investigada tem o potencial de causar prejuízo à concorrência.

2.6. Indícios de discriminação anticompetitiva
82.           Conforme já exposto, a SG entende que existem nos autos indícios robustos do ilícito concorrencial narrado pela denúncia que deu origem ao presente feito e suficientes para ensejar a instauração de Processo Administrativo para Imposição de Sanções Administrativas por Infrações à Ordem Econômica. A presente seção traz o que foi apurado em fase de inquérito administrativo acerca da possível existência da conduta e de seu caráter potencialmente anticompetitivo. O tópico 2.6.1 a seguir detalha a existência, natureza e extensão da discriminação de preços. O tópico 2.6.2 adiante traz uma exposição das justificativas apresentadas pela Representada para a prática, com a respectiva análise desta SG a respeito de sua legitimidade econômica e concorrencial. Posteriormente, o tópico 2.6.3 relata indícios qualitativos adicionais trazidos pelo Departamento de Estudos Econômicos do Cade (DEE) em seu acompanhamento da decisão deste Conselho no AC GBD e pela ARSESP em procedimento próprio.

2.6.1. Da discriminação
83.           O argumento central trazido pela Representante para a existência de discriminação anticompetitiva é o fato de não haver nenhuma contrapartida, nos contratos TCQ, dos descontos concedidos a partir de abril de 2011 aos contratos da NPP. Visto que algumas distribuidoras atualmente contratam gás canalizado apenas sob os contratos NPP, a Comgás entende que os descontos oferecidos a concorrentes, e não oferecidos a ela, a prejudicam, na medida em que seu mix, composto por NPP + TCQ, fica mais caro em comparação ao valor pago pelas outras distribuidoras. Em especial, a Comgás se preocupa com o preço mais barato em decorrência de tais descontos que estaria sendo oferecido à concessionária GBD, que, além de possuir apenas contratos NPP, está localizada em área de concessão contígua e é detida integralmente pela Petrobras. A Representada afirma, ainda, que os descontos do NPP não são previstos contratualmente, mas, sim, são efetuados na fatura, sendo a sua concessão uma decisão unilateral da Petrobras.
84.           Cumpre esclarecer que a Comgás não se insurge contra o fato de ter contrato TCQ com a Petrobras, enquanto outras concessionárias têm somente contrato NPP. O objeto da reclamação da Comgás é o desconto extra, fora do contrato, dado pela Petrobras somente nos contratos NPP, sem contrapartida nos contratos TCQ.
85.           A existência da política de descontos executada pela Petrobras exclusivamente nos contratos NPP é fato público e notório que foi confirmado por diversas vezes pela própria Representada nos autos do presente processo.
86.           A Representante apresentou gráfico demonstrando a diferença mensal de preços entre os contratos TCQ e NPP com desconto para o período de dezembro de 2012 a janeiro de 2014, sendo que, para este último mês, o DEE estimou que a diferença entre os dois contratos foi de 22%.[31] No entanto, deve-se levar em consideração que a Comgás possui um mix composto em (ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS) de TCQ e (ACESSO RESTRITO CADE E COMGÁS) de NPP. Ao ponderar a discriminação pelo mix das concessionárias Comgás e GBD (100% NPP), a ARSESP encontrou diferença média de 10,75% para o período de dezembro de 2012 a abril de 2014 (fl. 570).
87.           A despeito de reconhecer a existência dos descontos, a Petrobras alega que eles são conferidos de maneira isonômica para todas as distribuidoras que possuem o NPP, em todo o volume de gás fornecido sob essa modalidade contratual e com o mesmo critério de cálculo. Para comprovar suas alegações, a Representada juntou aos autos (fls. 315-316 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Petrobras) memória de cálculo das deduções concedidas e cópia de várias comunicações de descontos feitas a diferentes distribuidoras (fls. 36-123, ibid.). Efetivamente, corroborando o que foi afirmado pela Petrobras nesse aspecto, não há denúncias de que o método de cálculo dos descontos seja discriminatório e, tampouco, foram apurados indícios nesse sentido durante o inquérito.
88.           Entretanto, a isonomia na aplicação do desconto não garante a ausência de discriminação entre distribuidoras diferentes, pois somente aquelas que possuem contrato NPP seriam beneficiadas em detrimento das que se utilizam de contratos TCQ, ou mesmo das que possuem um mix de gás TCQ e NPP, como a Comgás. Dessa forma, o que determina se há discriminação entre distribuidoras é a existência de descontos exclusivamente nos contratos NPP, ocasionando diferença no preço final entre distribuidoras que possuem porcentagens diferentes de NPP em seu mix. Portanto, no presente caso, cumpre averiguar as justificativas para a existência de descontos não previstos contratualmente no NPP e a ausência de descontos nos contratos TCQ. Ainda, visto que os contratos de gás possuem várias condições diferentes, não se pode descartar a possibilidade de haver diferenças concorrencialmente relevantes em outras condições contratuais que não o preço.[32]
89.           Pela análise contida na seção 2.3 acima, que expôs as condições para observação da conduta investigada, a simples existência de discriminação não constitui, por si só, ilícito antitruste. Para tanto, é necessário observar a presença de poder de mercado do agente que pratica a discriminação, o potencial lesivo da conduta e a legitimidade das justificativas para ela oferecidas. O poder de mercado da Representada já foi analisado na seção 2.4, enquanto o potencial lesivo da conduta foi constatado na seção 2.5. Passa-se agora à análise das justificativas da conduta tal como oferecidas pela Representada (tópico 2.6.2).

2.6.2. Análise das justificativas para a prática
90.           Ao ser indagada sobre a motivação da concessão de descontos no NPP, a Petrobras afirmou que eles começaram a ser concedidos com o intuito de manter a competitividade do gás natural frente a outros energéticos frequentemente utilizados como substitutos, em especial o óleo combustível.[33] Justamente por isso, a política de descontos foi iniciada em abril de 2011, quatro anos depois do início da NPP (2007), quando o gás natural começou a perder competitividade para o óleo combustível.[34] Assim, a política de descontos teria surgido com a finalidade de manter a competitividade do gás natural, representando uma decisão unilateral e temporária da Representada, completamente desvinculada de qualquer cláusula contratual, podendo ser renovada trimestralmente. A partir disso, listam-se abaixo as principais características dos descontos, segundo a Petrobras:
                                                 i.                   Têm como propósito a manutenção da competitividade do gás natural;
                                                ii.                   São temporários, podendo ou não ser renovados a cada três meses;
                                              iii.                   São concedidos apenas nos contratos NPP;
                                              iv.                   São isonômicos para todo o volume contratado em NPP e calculados a partir da mesma porcentagem (ACESSO RESTRITO AO CADE E À PETROBRAS) para cada distribuidora;
                                                v.                   São fruto de decisão unilateral da Petrobras e estão desvinculados da NPP, não possuindo nenhuma previsão contratual e sendo efetuados na fatura do gás vendido. As distribuidoras são apenas informadas dos descontos que estão recebendo a cada trimestre.

91.           Note-se que a Representada defende que os descontos seriam temporários e não poderiam ser classificados como política de preços. A SG entende que essa linha argumentativa não procede, pois uma prática de concessão de descontos com o alegado objetivo de manter a competitividade de um produto estendida por um período de tempo tão longo – mais precisamente, por quase quatro anos, de 2011 até o presente momento – deve ser efetivamente compreendida em termos econômicos como uma política de preços. Ainda que assim não fosse, porém, eventual prática de descontos discriminatórios por mais de 4 anos é suficiente para surtir preocupações concorrenciais.
92.           Indagou-se à Petrobras o motivo de os descontos não terem sido concedidos em outras modalidades contratuais, sobretudo nos contratos TCQ, o que, basicamente, constitui o foco da presente investigação. A Representada respondeu que o método de cálculo do preço do TCQ não é flexível, de modo que não seria possível abaixar o preço desse contrato sem incorrer em prejuízo, devido ao fato desse tipo de contrato possuir característica de mero repasse de custo do gás adquirido junto à produtora, adicionado ao custo do transporte, sendo o preço contratualmente vinculado à origem do gás (Bolívia). Tal modelo de negócios seria fundamentalmente distinto dos contratos NPP, em que a empresa vende uma cesta indefinida de gás proveniente de diversas origens (boliviano, brasileiro, GNL importado), precificado por meio de uma fórmula contratual mais flexível com a aplicação de política postal (ver seções 2.1 supra e 2.6.2.2 infra). Dessa forma, o NPP permitiria manejar custos de forma a comportar a aplicação de descontos; de modo contrário, a rigidez do TCQ, contratualmente vinculado ao preço da origem, não permitiria esse espaço de manobra.[35]
93.           Como elemento adicional de justificativa da conduta supostamente discriminatória, a Petrobras afirma que ofereceu sucessivas vezes à Comgás a oportunidade de migrar seus contratos TCQ para os contratos NPP, de forma a viabilizar o tratamento isonômico. Tal argumento será melhor analisado no tópico 2.6.2.2.
94.           Assim, em síntese, a Representada fornece como justificativas para a ausência de desconto nos contratos TCQ:
                                                 i.                   O argumento de que a fórmula de precificação e o modelo de negócios deste tipo de contrato não permitirem a concessão de descontos sem a assunção de prejuízo, diferentemente do NPP;
                                                ii.                   O fato de que a migração ao contrato NPP teria sido oferecida reiteradas vezes à Representante, que não aceitou as propostas.

95.           Entretanto, esta SG entende que há um desalinhamento entre as justificativas oferecidas pela Petrobras, de um lado, e as características da política de desconto e o histórico de negociação contratual entre as partes, de outro. Para melhor explorar esses pontos, a análise será segmentada e individualizada para cada uma das duas justificativas que se acabou de listar.

2.6.2.1. Objetivo da política de descontos, ausência de previsão contratual e características do contrato TCQ
96.           No gráfico abaixo, juntado pela Representante à fl. 730, é possível visualizar o sucesso da política de descontos em manter a competitividade do gás natural adquirido sob o NPP (contrato denominado “Firme”, representado pela linha verde) frente ao óleo combustível (linha cinza). A linha tracejada demonstra o preço do gás do contrato NPP sem desconto, que se tornou menos competitivo que o combustível concorrente a partir de abril de 2011. Com a política de descontos, portanto, o gás natural fornecido pela NPP manteve a competitividade do produto frente aos demais substitutos energéticos[36]. Entretanto, o mesmo não pode ser dito do gás fornecido pelo contrato TCQ, que a partir de março de 2012 passou a ter sérios problemas de competitividade (linha azul).

Gráfico 1

Fonte: Representante, fl. 730.

97.           Segundo se apurou em reuniões com as indústrias consumidoras, para que o gás natural se mantenha competitivo frente ao óleo combustível, tendo em vista a eficiência energética alcançada pelos dois produtos, é necessário que o seu preço fique alguns pontos percentuais abaixo do concorrente, como pode se observar do gráfico acima (em que o preço do gás com desconto é aproximadamente 85% do preço do óleo durante o primeiro ano da política de descontos). Assim, se o gás for, por exemplo, 95% do preço do óleo, a competitividade já não se mantém, visto que o preço ligeiramente menor não compensa a eficiência energética dos combustíveis. Considerando que, dentro de sua área de distribuição, uma concessionária compete primariamente com os combustíveis alternativos ao gás natural devido ao monopólio da distribuição canalizada, as concessionárias que possuíam o TCQ em seu mix passaram a ser mais afetadas, o que pode ser visualizado nos gráficos a seguir:

Gráfico 2 – Comparativo de preços entre o gás natural para o segmento industrial e o óleo combustível na Bahia

Fonte: Ministério de Minas e Energia – Boletim Mensal de Acompanhamento da Indústria de Gás Natural, nº 90 (set. 2014).

Gráfico 3 – Comparativo de preços entre o gás natural para o segmento industrial e o óleo combustível na área de concessão da Comgás

Fonte: Ministério de Minas e Energia – Boletim Mensal de Acompanhamento da Indústria de Gás Natural, nº 90 (set. 2014).

Gráfico 4 – Comparativo de preços entre o gás natural para o segmento industrial e o óleo combustível na área de concessão da CEG (interior do estado do Rio de Janeiro)

Fonte: Ministério de Minas e Energia – Boletim Mensal de Acompanhamento da Indústria de Gás Natural, nº 90 (set. 2014).

98.           É possível observar que, a partir de fevereiro de 2012, o preço do gás na região de concessão da Comgás perde competitividade para o combustível concorrente, enquanto nas regiões da Bahia e do interior do Rio de Janeiro o preço do gás mantém a competitividade em patamar estável relativamente ao preço do energético substituto.
99.           Isso evidencia que o objetivo de dar competitividade ao gás natural não tem tido sucesso na região de concessão da Comgás. Assim, há uma incongruência entre o objetivo da prática investigada (qual seja, dar competitividade ao gás natural como um todo) e o resultado obtido para essa região. Tendo em vista que a Comgás pratica preços regulados e possui um mix de contratos NPP e TCQ, e tendo sido demonstrada a efetividade dos descontos do NPP no objetivo proposto, é possível inferir que a perda de competitividade do gás na região da Representante esteja associada aos preços do contrato TCQ, que não têm desconto. Depreende-se que a política de descontos, que visa à competitividade do produto gás natural, está garantindo a competitividade somente do gás vendido sob NPP, e não do gás vendido sob TCQ. Assim, é importante que haja uma justificativa econômica legítima para que os descontos não possam ser estendidos ao contrato TCQ, que compõem parcela relevante domix da Comgás, sob pena de haver discriminação de concessionárias concorrentes por parte da Representada em favor de algumas concessionárias integradas.
100.       A justificativa oferecida pela Petrobras para não poder oferecer desconto no TCQ fundamenta-se nas diferenças no método de cálculo do preço do gás entre os dois contratos. Nesse tipo de contrato, o preço do gás se divide nas parcelas da molécula e de transporte, corrigidas cada uma por um indexador de preços. A parcela da molécula equivale ao preço vendido pela produtora boliviana, enquanto a parcela de transporte corresponde ao custo de deslocar o gás até a distribuidora. Conforme se adiantou na introdução da presente seção, a Petrobras alega que esse contrato é simplesmente um instrumento de repasse de custos, no qual ela não tem controle sobre a parcela da molécula (i.e., os riscos de fornecimento estariam associados à empresa estrangeira) e apenas adiciona o custo de transporte (pois é proprietária do duto de transporte), revendendo o gás às distribuidoras. Assim, por conta da natureza desse contrato, a Representada não teria margem para aplicar descontos.
101.       De modo oposto, a NPP foi pensada para dirimir essa separação entre preço da molécula e custo de transporte. Nos contratos NPP, também há duas parcelas, uma referente a um custo fixo e outra referente a um custo variável. A Petrobras utiliza essa fórmula para fazer uma política postal, de modo a não onerar os estados que estão mais longe da fonte produtora/importadora com custo de transporte mais alto. Assim, a empresa administra o preço de todas as fontes de gás (boliviano, nacional, GLP importado) e repassa de maneira equilibrada entre todos os contratos NPP, segundo seu critério de preço.[37] Trata-se de um modelo de negócios, em que a Petrobras assume tanto os riscos do fornecimento quanto os do transporte. Dentro desse esquema, de acordo com a Representada, a NPP é flexível o suficiente para permitir a aplicação dos descontos, mas o TCQ não é.
102.       Apesar da efetiva diferença entre os modelos de precificação dos contratos, as características (i) da política de descontos e (ii) dos gasodutos de transporte não permitem inferir que isso seria relevante para justificar a existência de descontos discriminatórios.
103.       Quanto às características da política de descontos, a Representada afirma reiteradamente que o desconto não está vinculado a nenhum tipo de contrato, o que ficou confirmado pelos contratos NPP presentes nos autos.[38] De fato, não existe previsão contratual para a concessão dos descontos, que são retirados na fatura e meramente informados às distribuidoras. A Petrobras, portanto, tem toda a discricionariedade para escolher os critérios de cálculo e de aplicação dos descontos.[39] A incerteza a respeito da continuidade dos descontos, que são renovados a cada três meses, bem como dos seus valores, configura assimetria de informação à medida que a Petrobras detém toda a informação para a concessão de descontos, confirmando a discricionariedade e a total desvinculação contratual dessa política.
104.       Na memória de cálculo do valor dos descontos (fls. 315-316 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Petrobras), a Representada indica que os cálculos são feitos a partir de (ACESSO RESTRITO CADE E REPRESENTADA). Entretanto, isso não constitui elemento de vinculação jurídica ou mesmo econômica dos descontos ao contrato, mas antes o método encontrado para melhor efetuar o cálculo de maneira isonômica entre as distribuidoras, considerando o percentual de desconto desejado pela Petrobras. O valor dos descontos continua atrelado ao objetivo de manter a competitividade do gás, sendo a fórmula de cálculo apresentada pela Petrobras meramente um mecanismo de implementação na NPP, que não comprova a impossibilidade de implementação em outros contratos. Nesse contexto, dado o objetivo de manutenção de competitividade do produto, caberia à Petrobras elaborar, assim que o preço do contrato TCQ ultrapassou o do NPP em 2012, um método de cálculo análogo para o TCQ de modo a adequar a política de descontos a essa modalidade contratual, mantendo a coerência com os alegados objetivos de sua política. No entender da SG, a constatação de que a Petrobras não procedeu a essa adaptação, aliada ao fato de que a concessão de desconto é discricionária e desvinculada do instrumento contratual, constitui forte indício de que a aplicação de descontos apenas aos contratos NPP constitui prática discriminatória anticompetitiva, que beneficia em especial as concessionárias vinculadas à própria Petrobras e prejudica concessionárias concorrentes (Comgás).
105.       Quanto às características dos gasodutos de transporte, ambas a Comgás e a Petrobras afirmam que, com a integração da rede das regiões Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul, não é mais possível determinar com certeza a origem da molécula. Vale dizer que o gás produzido no Brasil poderia estar sendo usado para abastecer, por exemplo, a Comgás, assim como GNL importado poderia chegar por algum porto com estação de regaseificação e abastecer a GBD.
106.       Com base nisso, a Comgás alega que a Petrobras estaria vendendo o mesmo produto com preços diferentes, o que caracterizaria ainda mais a discriminação. A Representada, por sua vez, alega que o fato demonstra a especificidade de sua nova política de preços, cujo modelo de negócios seria adaptado à situação presente, de método de cálculo flexível com política postal e, portanto, passível de aplicação de descontos, enquanto os contratos TCQ teriam um modelo de negócios mais rígido, ainda vinculado aos riscos e preços da fornecedora boliviana.
107.       Tendo em vista que a determinação da origem do gás tem caráter eminentemente técnico, esta SG consultou a ANP por meio do Ofício 4725/2014/SG/CADE (fls. 789-90). Em resposta, a agência afirmou que não é possível haver bifluxo no gasoduto Bolívia-Brasil (“Gasbol”), onde o gás corre somente na direção Bolívia-Brasil. O traçado do Gasbol em território nacional pode ser visualizado na figura a seguir:

Figura 2 – Traçado do Gasbol no Brasil

Fonte: Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil S.A. (“TBG”), disponível em: http://www.tbg. com.br/pt_br/publicacoes/materiais-de-comunicacoes/integridade.htm, Acesso: 12/11/ 2014.

108.       Conjugando o mapa das áreas de concessão de São Paulo na figura 1 e a figura 2, observa-se que o Gasbol é o único gasoduto que abastece a área de concessão da GBD e que essa área é a primeira do estado de São Paulo a receber o gás boliviano. Na área de concessão da Comgás, o Gasbol é bifurcado na cidade de Paulínea, de onde prossegue para abastecer, de um lado, a área da SPS e a região Sul e, de outro, o restante da rede, conforme se observa na figura 3 a seguir.

Figura 3 – Rede de gasodutos de transporte em operação (2011)

Fonte: http://gasnet.com.br/gasodutos/operacao.asp, acesso em 12 nov. 2014.

109.       Considerando o traçado dos gasodutos e o fato de que o gás só corre no sentido Bolívia-Brasil dentro do Gasbol, a ANP conclui que:
Em alguns casos, é possível determinar, a origem do gás fornecido pela Petrobras a uma determinada distribuidora. Isso porque a área de concessão da Gás Brasiliano [GBD] somente pode ser abastecida pelo Gasbol. Assim, essa distribuidora recebe apenas gás de origem boliviana.
Em relação às demais distribuidoras que operam no Estado de São Paulo (Comgás e Gás Natural São Paulo Sul [SPS]), não é possível determinar a origem do gás. Isto porque parte da área de concessão da Comgás e a totalidade da área concedida à Gás Natural São Paulo Sul estão situadas após a interconexão em Paulínea (SP). Dessa forma, podem receber gás de qualquer das quatro fontes citadas na resposta do item a [(i) Bolívia; (ii) Bacia de Campos; (iii) Bacia de Santos; e (iv) GNL importado, que chega pelo mar e, após regaseificado, é enviado para São Paulo por meio de gasoduto no fluxo oriundo da Bacia de Campos]. (fl. 851.)

110.       A partir dessas informações, ao contrário do que foi alegado pela Representante e pela Representada acerca da origem do gás, extrai-se que a Petrobras fornece apenas gás de origem boliviana à GBD, pois é atualmente o único meio viável de efetuar esse abastecimento na forma canalizada. Assim, o desconto no contrato NPP da GBD é aplicado sobre gás boliviano. Isso denota que a Petrobras tem capacidade de oferecer descontos ao gás mesmo quando ela o adquire pelos preços da fornecedora boliviana. No entender desta SG, tal constatação, aliada ao fato de que não há vinculação contratual do desconto, atesta contra a justificativa da Representada de que o modelo de negócios do TCQ inviabiliza a concessão de desconto por ser contrato de repasse de custos.
111.       Em razão disso, a SG entende que o elemento técnico de possibilidade geográfica de abastecimento constitui mais um indício de prática discriminatória anticompetitiva por parte da Petrobras, na medida em que torna implausível a justificativa de diferenças contratuais e de modelo de negócios oferecida pela Representada e destitui a conduta investigada de fundamento econômico legítimo.

2.6.2.2. Histórico de negociação entre as partes
112.       Ao se defender das alegações da Comgás, a Petrobras aponta, ainda, que ofereceu diversas vezes à Comgás a migração do volume de gás contratado sob o TCQ para os contratos NPP. Com isso, a Representada entende que buscou ao máximo ser isonômica na sua relação com a Representante. Faz-se necessário, então, analisar em que medida isso poderia ser uma justificativa legítima para a concessão de descontos apenas nos contratos NPP.
113.       Nos autos do presente processo constam três ocasiões em que houve tratativas oficiais para negociar a migração dos contratos.
114.       A primeira delas foi feita em 2007, quanto a NPP teve início. A Petrobras afirma que a NPP seria a única modalidade contratual ofertada para as distribuidoras daquele momento em diante e que sua intenção era estimular ao máximo a migração do volume já contratado (TCQ e gás nacional) para a NPP. A segunda oferta foi realizada em 2011, antes do início da política de descontos. Já a terceira foi feita em 2012, após o início da política de descontos.
115.       Na época da primeira oferta, não havia motivos para a Comgás aceitar a migração, pois a NPP seria iniciada com preços substancialmente mais caros que o seu contrato TCQ ainda em vigência, conforme é possível observar do gráfico 5. Em 2011 essa realidade não se alterou, visto que a oferta foi feita em janeiro daquele ano (fls. 707-709 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Comgás), antes do início dos descontos (v. gráficos 1 e 5). Segundo a Comgás, à época das negociações a Petrobras não alertou da futura política de descontos que entraria em vigor alguns meses depois. Observe-se que a Representada não ofereceu contestação à alegação da Comgás.
116.       Na oferta feita em 2012, quando finalmente os preços NPP estavam mais baixos que os preços TCQ exclusivamente em virtude dos descontos, a Petrobras impôs uma condição de encontro de contas para que a Comgás migrasse seus volumes. Tal condição consistia no pagamento de quantia aproximadamente equivalente a (ACESSO RESTRITO CADE, COMGÁS E PETROBRAS), referente à diferença dos preços TCQ mais baixos experimentados pela Comgás desde o início da política NPP até o início da política de descontos (área hachurada do gráfico 5, ponderada pelo volume contratado pela Comgás no período). Segundo a Petrobras, essa medida teria como objetivo o tratamento isonômico entre as distribuidoras, pois, sem ela, a Comgás estaria sendo favorecida em relação às demais concessionárias, que tiveram o ônus de pagar pelo NPP enquanto esse esteve mais caro.

Gráfico 5

Fonte: Representante, fl. 729, área hachurada adicionada.

117.       Ora, a condição de encontro de contas imposta pela Representada constitui indício de tratamento não isonômico entre as distribuidoras no acesso aos preços mais favorecidos dos descontos da NPP, reforçando o caráter discriminatório da prática.
118.       Não existe previsão contratual para o encontro de contas. A decisão de não migrar seu volume TCQ para a NPP foi um risco tomado pela Comgás que, conhecendo as condições contratuais de ambos os contratos, decidiu manter os direitos e obrigações contraídos quando da assinatura do TCQ. Com isso, a Comgás colheu os benefícios do seu risco por meio de um mix mais favorável a partir da NPP. Frise-se que o contrato TCQ apresenta mais riscos que o NPP, em virtude de sua indexação em cesta de combustíveis, maior escala e maior percentual de take-or-pay e ship-or-pay,[40] o que deveria fazer com que seu preço fosse naturalmente inferior.
119.       Ressalte-se, ainda, que, antes da NPP, a Comgás arcou com o custo de ter um contrato mais caro durante aproximadamente sete anos (de 2000 a 2006, vide gráfico 5, no qual a linha azul corresponde ao TCQ e a linha vermelha ao contrato nacional). Depois de iniciada a NPP, a Comgás não exigiu novas condições da Petrobras, mas apenas que a vigência do contrato TCQ fosse mantida. O surgimento dos descontos, no entanto, foi um fator estranho ao contrato NPP, que não poderia ter sido previsto pela Comgás. Portanto, a condição de encontro de contas não guarda nenhuma relação com o histórico negocial entre a Comgás e a Petrobras, nem com as informações e obrigações disponíveis à Representante nos contratos NPP e TCQ, nem com o risco tomado pela Comgás quando da assinatura do TCQ (ora favorecendo-a nos preços, ora prejudicando-a). A condição da Petrobras apenas impõe uma barreira para que a Comgás possa usufruir dos descontos através da migração de seu volume para o contrato NPP, constituindo custo de troca criado de maneira artificial e extracontratual.
120.       Em complemento a isso, cumpre ponderar que as justificativas apresentadas pela Representada em sede de inquérito administrativo não lograram demonstrar a legitimidade da aplicação de descontos exclusivamente nos contratos NPP, sem extensão aos TCQ (ver tópico 2.6.2.1 anterior). Assim, considerando que a Comgás já possuía contrato TCQ com vigência até 2019, não está demonstrada a necessidade de ela se submeter à migração de volume para ter acesso aos descontos.
121.       Tal conclusão fica mais evidente a partir da compreensão do papel dos contratos no negócio de uma distribuidora de gás. Devido aos riscos e à inconstância da demanda de gás, bem como ao elevado custo relativo do investimento em capital (dutos), tanto no setor de transporte quanto no de distribuição, os contratos costumam ser de médio ou longo prazo, com cláusulas de take-or-pay e ship-or-pay. Assim, outras condições contratuais além do preço também são relevantes para a atuação de uma distribuidora. Dentre as principais condições, podem-se citar:
                                                 i.                   O prazo de vigência dos contratos: se todos os contratos de uma distribuidora vencem na mesma época, não só o risco aumenta, como também o poder de barganha diminui perante as fornecedoras;
                                                ii.                   A origem do gás (ou a empresa fornecedora): se o fornecimento de gás de uma origem é interrompido, é importante ter outras fontes capazes de substituir temporariamente o fornecimento primário;
                                              iii.                   As fórmulas de cálculo do preço: variações na fórmula podem causar alterações substanciais de preço, seja em virtude dos elementos principais da fórmula (parcelas de molécula e transporte, ou fixa e variável), seja em virtude dos indexadores utilizados;
                                              iv.                   Os percentuais de take-or-pay e ship-or-pay.

122.       Todos esses itens estão relacionados, em maior ou menor medida, ao risco da atividade da distribuidora, o que pode motivá-la a possuir mais de um contrato de fornecimento para diluir ou gerir melhor seu risco. Assim, faz parte da eficiência da distribuidora a sua capacidade de entabular negociações contratuais com o intuito de obter a melhor combinação entre um preço mais baixo para o seu mix e uma exposição não excessiva ao risco.
123.       No mercado brasileiro, a Petrobras é a única fornecedora de gás. Visto que a maioria das distribuidoras é verticalmente integrada, o equilíbrio entre as opções contratuais não tem tanto peso quanto em países com menor verticalização nesse setor e com mais players no mercado a montante. Entretanto, para as distribuidoras não integradas tais como a Representante, é melhor possuir contratos variados caso exista, em algum momento, essa oportunidade.
124.       No caso dos contratos NPP, a condição de contratação (iii) acima, relativa às fórmulas de precificação, mostra-se especialmente relevante para a decisão de contratação por parte da distribuidora. Conforme mencionado, a NPP alterou a fórmula de cálculo. Antes dela, a fórmula dos contratos seguia padrões internacionais e era determinada da seguinte forma:


125.       Com a NPP, a fórmula passou a ser:




126.       Para a Comgás, a nova fórmula é menos transparente, pois não revela explicitamente a remuneração de cada fator da estrutura de custos. Somada a isso, a falta de vinculação contratual da política de descontos da Petrobras torna a manutenção desse desconto incerta e arriscada, podendo ser encerrada ou atenuada a cada três meses. Assim, considerando a importância dessas condições contratuais para a atividade de gerenciamento de risco de uma distribuidora, é plausível supor que a migração contratual para o NPP com desconto poderia até mesmo não ser vantajosa ainda que não houvesse nenhuma barreira de encontro de contas, a depender da magnitude da discriminação de preços.
127.       A partir dos indícios relatados acima, apurados em inquérito, esta SG entende que a exigência de migração contratual feita pela Petrobras não é razoável e que essa prática reforça a suposta conduta discriminatória objeto dos autos do presente inquérito administrativo ao estabelecer artificialmente um custo de troca.
128.       Como indícios adicionais nesse sentido, tem-se, em primeiro lugar, que a alegação de que o método de cálculo da NPP é pouco transparente foi confirmada pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE) nos autos do AC GBD (fls. 780 e ss. daquele feito), pela ANP nos autos do presente feito (nota de fls. 302 e ss., apartado restrito ao Cade e à Comgás) e por estudo de 2011 da Federação de Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN).[42]
129.       Em segundo lugar, a imprevisibilidade dos descontos foi recentemente alegada pela Abegás em manifestação destinada ao Cade, à Petrobras e ao MME (fls. 783-788) e também pela Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, no Ofício nº 150 encaminhado ao Ministro de Minas e Energia (fls 711-712). Os documentos da Abegás e da Câmara foram motivados por decisão recente da Petrobras de diminuir o percentual de descontos, o que estaria prejudicando a indústria que consome gás natural canalizado. Tal incidente adiciona plausibilidade ao argumento da Representante sobre incerteza dos descontos do contrato NPP e de necessidade de uma distribuidora não integrada tentar variar seus contratos de fornecimento.
130.       Por fim, não se descarta a possibilidade de as distribuidoras verticalmente integradas à Petrobras terem uma leitura melhor de mercado quanto à manutenção dos descontos, o que colocaria a Comgás e as outras distribuidoras não integradas em posição desfavorecida, enfrentando maior assimetria de informação.
131.       Pelos motivos aludidos acima, esta SG entende que a Petrobras não disponibilizou de maneira isonômica a possibilidade de migração contratual depois da concessão de descontos, impondo à Comgás uma barreira ao acesso aos descontos da NPP. Além disso, entende que não é razoável impor a migração contratual como condição de acesso a descontos extracontratuais de prazo incerto voltados à competitividade do gás natural, ainda que a migração contratual tivesse sido ofertada de maneira isonômica.

2.6.3. Indícios complementares: análises do DEE/CADE e da ARSESP em outros processos
132.       Adicionalmente aos indícios reportados até aqui, o DEE/CADE e a ARSESP produziram no âmbito de outros processos análises cujas conclusões reforçam as da presente nota.
133.       Ao constatar a diferença de preços entre TCQ e NPP oriunda dos descontos nesse último contrato, a ARSESP instaurou procedimento próprio para apurar se as atuais exigências de tratamento isonômico ditadas pela regulação paulista estariam sendo infringidas. [43] (ACESSO RESTRITO AO CADE E À PETROBRAS)
134.       Já o DEE/CADE analisou a discriminação por meio dos descontos em sua última manifestação no âmbito do acompanhamento de decisão do já mencionado AC GBD (AC nº 08012.006171/2010-03, Nota Técnica nº 26/2014/DEE/CADE, autos confidenciais daquele feito). Naquela operação, de aquisição da GBD por parte da Petrobras, o Cade impôs a restrição de monitoramento dos contratos de fornecimento de gás da Petrobras às distribuidoras. A nota técnica elaborada pelo DEE/CADE volta-se a analisar “empiricamente se as preocupações concorrenciais evidenciadas no voto do conselheiro relator [de restrições verticais por parte da Petrobras em favor da GBD] consumaram-se ou se os remédios adotados foram suficientes para afastar os potenciais danos à livre concorrência.” (p.1) Passa-se a resumir as conclusões daquela análise.
(ACESSO RESTRITO AO CADE E À PETROBRAS)
149.       Do exposto, conclui-se que as análises das peças do DEE/CADE e da ARSESP acima expostas constituem indício complementar à presente análise, corroborando o quanto apurado em sede de inquérito administrativo no que tange à forte possibilidade de existência da conduta denunciada, probabilidade de dano concorrencial dela decorrente e a suposta falta de justificativa econômica legítima para a prática.

150.       Diante do exposto, em virtude da existência de indícios robustos de infração à ordem econômica, sugere-se a instauração de Processo Administrativo para Imposição de Sanções Administrativas por Infrações à Ordem Econômica, nos termos dos arts. 13, V, e 67 da Lei nº 12.529/2011, c/c os arts. 135 e seguintes do Regimento Interno do Cade, em face da Representada Petróleo Brasileiro S.A., a fim de investigar as condutas passíveis de enquadramento no artigo 36, incisos I e IV combinados com o seu §3º, incisos IV e X da Lei nº 12.529/2011, correspondentes ao art. 20, incisos I e IV, combinados com o art. 21, incisos V e XII, da Lei nº 8.884/1994.
151.       Sugere-se, ainda, a notificação da Representada, nos termos do artigo 70 do referido diploma legal, para que apresente defesa no prazo de 30 (trinta) dias. Neste mesmo prazo, a Representada deverá especificar e justificar as provas que pretende ser produzidas, que serão analisadas pela autoridade nos termos do artigo 155 do Regimento Interno do Cade. Caso a Representada tenha interesse na produção de prova testemunhal, deverá declinar na peça de defesa a qualificação completa de até 3 (três) testemunhas, a serem ouvidas na sede do Cade, conforme previsto no artigo 70 da Lei nº 12.529/2011 c/c artigo 155, §2º do Regimento Interno do Cade.
152.       Sugere-se, por fim, que a ANP seja notificada da decisão de instauração de Processo Administrativo para Imposição de Sanções Administrativas por Infrações à Ordem Econômica, acompanhada de cópia integral da presente Nota Técnica, nos termos da cláusula 3.1.2 do Acordo de Cooperação Técnica nº 6/2013 entre o Cade e a ANP.

Estas as conclusões. Encaminhe-se ao Superintendente-Geral.






[1] Isto é, o consumidor final não tem acesso ao gás diretamente por meio de um gasoduto de transporte, mas sim por meio de um duto de distribuição de menor pressão e maior capilaridade.
[2] Da sigla em inglês Transportation Capacity Quantity.
[3] Disponível no sítio eletrônico do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro:  (ACESSO RESTRITO CADE E PETROBRAS).
[4] Conforme classificação do voto do relator no AC nº 08012.006171/2010-03 (AC GBD), com base no Parecer da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda – SEAE/MF naqueles autos (fls. 496 e ss., autos públicos daquele AC). Para uma visualização completa da cadeia de gás natural no Brasil, v. Nota Técnica Conjunta ANP nº 002/2011-CDC-SCM (fls. 226 e ss., autos públicos do presente processo).
[5] Sobre as possibilidades de substituição do gás natural, v. p. ex. parecer da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda – SEAE-MF no AC de formação do Consórcio Gemini (AC nº 08012.001015/2004-08, Requerentes: Petrobras, White Martins Gases Industrias Ltda. e Gaspetro) e instrução realizada no âmbito dos Atos de Concentração nº 08700.006668/2014-99 (Requerentes: Companhia Energética de Minas Gerais e Gás Natural Internacional, SDG, S.A.) e nº 08012.001015/2004-08 (Requerentes: Petróleo Brasileiro S.A., Petrobras Gás S.A. e White Martins Gases Industriais Ltda.).
[6] Tais observações decorrem da tecnologia de distribuição aqui analisada, que consiste na forma canalizada. O mercado de distribuição a granel — como, por exemplo, GNC e GNL — não necessariamente apresenta tais características e frequentemente está sujeito a regulação societária/concorrencial menos intensa. Para uma análise concorrencial mais profunda da interação entre GNC, GNL e gás natural canalizado, v. Nota Técnica nº 16/2015/CGAA1/SGA1/SG/CADE, nos autos do Processo Administrativo nº 08012.011881/2007-41 (Representante: Comgás. Representada: Petrobras, White Martins Gases Industriais Ltda. e GNL Gemini Comercialização e Logística de Gás Ltda.).
[7] Disponível em: Acesso em 17/03/2015.
[9] V., p. ex., contratos de concessão entre o Estado de São Paulo e as distribuidoras de gás natural canalizado que atuam em seu território, entre elas a Representante.
[10] Nesse sentido: Atos de Concentração nº 08012.004550/1999-11, nº 08012.000035/2000-68 e nº 08012.005516/2001-11.
[13] A exemplo das manifestações no âmbito do AC Cemig-GNF da Usiminas, setor de siderurgia e mineração (PA e MG competem devido a recursos naturais e das facilidades para escoar a produção); da Suzano, setor de papel e celulose (que depende da disponibilidade de madeira, com unidades em estados de diferentes regiões como SP, MA e BA); e da ASPACER, setor de cerâmica (proximidade das jazidas de argilas, cujos principais produtores são SP, AM, MG, SC e RS).
[14] Cade. Guia Prático do Cade: a defesa da concorrência no Brasil. 3ª edição revista, ampliada e bilíngue. Disponível em: http://www.cade.gov.br/publicacoes/guia_cade_3d_100108.pdf. Acesso em: 24/10/2014.
[15] Anexo I à resolução Cade nº 20, de 9 de junho de 1999.
[16] Anexo I à resolução Cade nº 20, de 9 de junho de 1999.
[17] Representante: Steel Placas Indústria e Comércio Ltda., Representados: Comepla Indústria e Comércio e outros, julgado em 23/05/12. Disponível em: <http://www.cade.gov.br/temp/D_D000000669951414.pdf >. Acesso em 17/03/2015.
[18] SOLON, Ari Marcelo. Diferenciação de preços no direito concorrencial. Revista Direito Mackenzie, nº 1, ano 1.
[19] Além dos trechos da malha integrada, a Petrobras controla os gasodutos da malha não integrada do Amazonas e tem participação no gasoduto que liga a Argentina ou município gaúcho de Uruguaiana. O único trecho de transporte em território nacional sem participação da empresa é a bifurcação do gasoduto Bolívia-Brasil que vai até Cuiabá. Esse trecho não pertence ao sistema interligado e não está relacionado ao abastecimento do estado de SP. Para melhor visualização dos trechos de transporte no território nacional, v. Figura 3 na seção 2.6.2 adiante. Para um dimensionamento mais detalhado do papel da Petrobras no mercado brasileiro de fornecimento de gás, v. nota da ANP de fls. 226-269, e resposta da ARSESP ao Ofício nº 2233/2014/SG/CADE (fls. 567-571).
[20] Quanto ao óleo combustível, além das alegações da Representante nesse sentido, v. constatações da nota técnica da Secretaria de Direito Econômico na Averiguação Preliminar nº 08012.002015/2006-89. V., ainda, dados da ANP referentes a 2013, segundo os quais a Petrobras detém participação nacional de 90% apenas no setor de distribuição de óleo combustível. (ANP. Anuário Estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis 2014. Disponível em: . Acesso em: 2 mar. 2014.) Quanto ao mercado de GLP, a Liquigás integra o Sistema Petrobras e é a segunda maior distribuidora do país, possuindo em 2010 cerca de 14% do mercado no estado de SP (v. parecer da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda no Ato de Concentração nº 08012.011945/2011-91, Requerentes: Companhia Ultragaz S.A., Tucunare Empreendimentos e Participações Ltda. e Repsol Gás Brasil S.A., julgado em 15 ago. 2012).
[21] Para maior detalhamento das possibilidades de competição entre gás canalizado e gás a granel, v. casos versando sobre o Consórcio Gemini, votos no AC nº 08012.001015/2004-08 e Nota Técnica nº 16/2015/CGAA4/SGA1/SG/CADE (SEI nº 0051499) no PA nº 08700.011881/2007-41.
[22] Conforme seção 2.2 acima.
[23] Segundo a ARSESP, esse foi justamente o objetivo da repartição do estado de São Paulo em áreas de concessão diferentes. Observe-se que a agência é uma das mais fortes de regulação do setor no Brasil e estimula essa concorrência de melhores práticas entre as três distribuidoras por ela reguladas.
[24] V. nota nº xxx 12 xxx supra.
[25] No AC Cemig-GNF, usado como base para a definição de mercado relevante geográfico ora adotada, a SG utilizou dados de extensão de rede e de volume vendido para fins de apuração de market share. Na presente análise, optou-se por utilizar apenas o volume vendido. Isso se deve ao fato de que a extensão de rede pode revelar informações distorcidas em virtude das grandes diferenças de densidade demográfica e de consumo entre os territórios e também de pressão entre os dutos contabilizados e de volume de gás que efetivamente flui em cada rede.
[26] Todos os valores de participação trabalhados no presente documento incluem as vendas das distribuidoras para o setor termelétrico, ao contrário do que aconteceu no AC Cemig-GNF. Isso porque, naquela ocasião, apenas o mercado de distribuição estava sendo considerado. Tendo em vista que o gás destinado a usinas termelétricas é contratado diretamente entre a usina e os agentes do mercadoup/midstream, não fazendo parte da carteira da distribuidora de aquisição de gás natural para suprimento ao mercado, a inclusão desse volume não fazia sentido para a análise daquele processo, pois as distribuidoras não têm nenhum controle sobre os contratos das térmicas. Entretanto, no presente caso, analisam-se dois mercados da cadeia, o de transporte e o de distribuição. Conforme já mencionado, a Petrobras é monopolista no mercado de transporte e a única fornecedora de gás canalizado no Brasil. Assim, é com ela que as térmicas negociam seus contratos, o que implica que o volume de gás consumido pelo setor é diretamente controlado pelo Grupo Petrobras enquanto agente transportador de gás. Não obstante, uma distribuidora recebe sua margem de distribuição normalmente quanto ao volume que abastece as térmicas na sua área de concessão, por meio de seus dutos de distribuição (como será visto adiante, margem de distribuição é a parcela do preço final do gás que reverte à distribuidora e que está sujeita à regulação estadual). Trata-se, portanto, de volume controlado pela transportadora que afeta a operação e a receita do mercado de distribuição, abrangendo os dois mercados analisados no presente caso e a relação entre eles. Além disso, a Petrobras possui presença significativa no mercado de termelétricas a gás, o que pode, em tese, influenciar decisões concorrencialmente relevantes da empresa nos setores de transporte e de distribuição. Por esses motivos, a estimação de poder de mercado no presente caso inclui o volume vendido às térmicas.
[27] A tabela inclui os valores vendidos pelas concessionárias às distribuidoras de GNC. A decisão de incluir tais dados decorre do fato de que as distribuidoras de GNC retiram seu gás diretamente do duto de distribuição de propriedade da concessionária, pagando a ela o valor referente à margem de distribuição e, frequentemente, ao próprio gás. Existe pendência no Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito dessa matéria (Reclamação nº 4210/SP), isto é, sobre se as distribuidoras de gás a granel (GNL e GNC) devem retirar seu gás do duto de transporte (pagamento à Petrobras) ou do duto de distribuição (pagamento à concessionária local). Até o momento, não houve decisão final do STF, mas houve liminar atualmente em vigor que confirma a retirada do gás no duto de distribuição, tal como é praticado atualmente.
Os dados de GNL não estão computados na presente estimação de poder de mercado porque a única planta de liquefação do país opera com a retirada de gás de duto de transporte, sem transferência financeira nem de produto entre a concessionária e a planta (v. Processo Administrativo nº 08700.011881/2007-41).
[28] Cumpre ressaltar que a aquisição da GBD pela Petrobras ocorreu em 20 de maio de 2010. Para facilitar o cálculo de participações, o volume total vendido pelo Grupo Petrobras no ano de 2010 inclui o volume da GBD. Ainda, a distribuidora CEG-Rio é controlada pelo Grupo Gás Natural Fenosa. Entretanto, a Petrobras possui participação de 37,41% na distribuidora, motivo pelo qual sua participação está sendo contabilizada como integrante do Grupo Petrobras e não do Grupo Gás Natural Fenosa. Assim, a participação do Grupo Gás Natural Fenosa se encontra subestimada nas tabelas do presente documento. Entende-se que isso não prejudica a análise em virtude de tal Grupo não estar envolvido na conduta investigada, sendo desnecessário maior aprofundamento a respeito de seu eventual poder de mercado. Por fim, Em decorrência da operação analisada no AC Cemig-GNF, aprovado sem restrições por meio de despacho de 30 de setembro de 2014, publicado no D.O.U. de 1º de outubro 2014, a Gasmig não integra mais o Grupo Petrobras, tendo sido incorporada ao Grupo Gás Natural Fenosa. Entretanto, visto que aquela operação ocorreu em data recente, esta SG não teve acesso a dados de mercado elaborados desde então, motivo pelo qual a Gasmig permanece integrante do Grupo Petrobras na análise aqui empreendida. Entende-se que isso tampouco deve prejudicar a análise, pois a conduta investigada teria se iniciado anos antes da referida operação.
[29] As faixas são classificadas seguindo a regulação, aplicando-se critérios de escala e destinação (residencial, industrial, veicular etc.).
[30] VALOR ECONÔMICO. Petrobras não mexe no preço do gás. 21 de fevereiro de 2014. Retirado de: . Acesso em: 28 jul. 2014. Destaca-se o último parágrafo do trecho transcrito, que dá a entender que o dano à base de clientes das distribuidoras paulistas estaria sendo perpetrado a custa de um subsídio cruzado em favor da base de clientes de outras distribuidoras, quase todas com participação da Petrobras.
[31] Na Nota Técnica nº 26/2014/DEE/CADE, elaborada para o acompanhamento de decisão do Cade nos autos do AC GBD e detalhada na seção 2.6.3 abaixo.
[32] Outras condições relevantes serão apresentadas na seção 2.6.2.2.
[33] Resposta ao Ofício nº 2288/2014/SG/CADE (juntada às fls. 591-600). A mesma justificativa foi oficialmente reportada à imprensa quando do lançamento da nova política de descontos (fl. 19).
[34] Para melhor visualizar essa tendência na série histórica, v. Gráfico 5 adiante.
[35] Os motivos da não concessão de descontos no TCQ foram objeto de dois ofícios por parte da SG, de nº 2288/2014/SG/CADE e nº 3869/2014/SG/CADE. As respectivas respostas foram juntadas, nos autos públicos, às fls. 591-600 e 755-757 e, nos autos restritos ao Cade e à Petrobras, às fls. 2-11 e 274-276. Ressalta-se que não foram juntados cálculos econômicos ou contábeis para demonstrar a impossibilidade de conceder descontos em gás TCQ. A Representada alegou, ainda, que, por ser empresa pública, qualquer prejuízo indevido por ela assumido seria alvo de fiscalização e punição por parte de autoridades tais como o Congresso Nacional, o Tribunal de Contas da União e o Ministério Público. Ademais, afirma que o contrato boliviano possui duas precificações diferentes a depender da quantidade adquirida: um preço para a retirada de até 16 milhões de m³/dia e outro preço mais caro para a retirada de até 30 milhões de m³/dia, sendo que a Comgás pagaria o preço mais barato.
[36] No mesmo sentido, v. manifestação da Abegás de fls. 783-788, em que, referindo-se aos descontos, afirma: “A política de preços que vem sendo praticada pela Petrobras com as Distribuidoras nos últimos três anos, nacionalmente unificada e refletindo parâmetros da economia nacional, permitiu ao gás natural permanecer competitivo frente aos demais substitutos energéticos e, por via de consequência, conferiu à indústria brasileira, que o utiliza como insumo ou matéria prima, a possibilidade de competir nos mercados interno e externo.” (fl.785)
[37] Vale ressaltar que, desde o fim de 2011, por determinação da Resolução nº 52/2011 da ANP, art. 10, inc. IV (disponível em: <http://nxt.anp.gov.br/NXT/gateway.dll/leg/resolucoes_anp/2011/setembro/ranp%2052%20-%202011.xml >), os preços dos contratos NPP também devem ser estruturados segundo as parcelas da molécula e de transporte. Assim, os contratos celebrados após essa data contém dispositivo formal com o método de precificação “parcela da molécula” + “parcela de transporte”. Entretanto, ao cumprir essa determinação, a Petrobras inclui no contrato algumas cláusulas que permitem efetivar, ainda assim, a sua política postal, cumprindo apenas formalmente a regulação da Resolução. Para tanto, a Representada estabelece, por exemplo, preços semelhantes de transporte para trechos muito diferentes, ou a alternatividade entre diferentes fórmulas contratuais de preço, uma delas a da regulação, a depender de critérios contratuais tais como a fórmula que resultar mais barata, sendo que, na prática, a fórmula aplicada é sempre a da NPP.
[38] Contrato Firme (NPP) entre Petrobras e GBD: fls. 371-426. Contrato Firme (NPP) entre Petrobras e Comgás: fls. 278-294, apartado de acesso restrito ao Cade e à Comgás.
[39] O que também foi afirmado por outras entidades nos autos, em especial a ARSESP, a Abegás e a Representante (respectivamente, fls. 570, 783-788 e peça inicial de denúncia)
[40] Take-or-pay é um tipo de cláusula contratual que penaliza a cliente por não consumir todo o volume de um produto contratado de uma fornecedora. Por exemplo, considerando um contrato com percentual de take-or-pay de 100%, se a empresa cliente contrata um volume de fornecimento igual a x > y, mas consome apenas y, será obrigada a pagar uma multa referente ao volume não consumido z = x - y. A multa é, em geral, menor que o valor que seria pago caso o volume fosse consumido a título desse consumo previsto. Ship-or-pay, por sua vez, é uma cláusula semelhante, com a diferença que se refere à capacidade de transporte contratada e não utilizada, em vez do volume contratado e não consumido.
[41] A ANP emitiu regulação em 2011 (Resolução ANP nº 52/2011) obrigando os fornecedores a expressar as fórmulas contratuais em parcelas explicitamente referentes ao produto e ao transporte. Entretanto, pelos motivos expostos na nota nº xx supra, essa regulação não teve o efeito prático desejado, de modo que o método de precificação dos contratos ainda mantém o método original da NPP. Lembre-se, ainda, que o contrato NPP da Comgás é anterior a essa regulação.
[42] FIRJAN. Quanto Custa o Gás Natural para a Indústria no Brasil? Estudos para o Desenvolvimento do Estado do Rio de Janeiro, nº 9, dez. 2011.
[43] A documentação do procedimento se encontra juntada às fls. 219-238 do apartado de acesso restrito ao Cade e à Petrobras.
[44] (ACESSO RESTRITO AO CADE E À PETROBRAS)
[45] (ACESSO RESTRITO AO CADE E À PETROBRAS)


Fonte: http://sei.cade.gov.br/sei/institucional/pesquisa/documento_consulta_externa.php?p_uubtTCtbKRcWvfFmgdFv--yiyVjAZG83D0YuWLXkK4jhn7QqlRXTIE9RZ6pYsKRiS7M3aQRKDLabbH688qLw,,

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Secretaria de Energia Estatais. energia elétrica Estatal Estatização Estação de Descompressão de Gás Natural Comprimido Europa Exxon Exxon Mobil Corp FERNANDO Meiter FRATURAMENTO HIDRÁULICO Feiras Fornecedor Francisval Mendes Frases em Destaque Fraturamento Hidráulico Não Convencional Frente Parlamentar G3 Óleo e Gás GASDUC III U GSF Gasbol Gasoduto Sul Andino Generation Scaling Factor Governador de São Paulo Gran Tierra Energy Brasil Guerra Gás Natural Fenosa (GNF) Gás Natural do Brasil Gás para Crescer HRT Participações em Petróleo IBGE IBV Brasil IRPJ Ilhas Malvinas Indústria petroquímica Infoenergia Insegurança jurídica Interconexão Iraque Irati Petróleo e Energia Irã Itália Japão José Sergio Gabrielli Jurídica Karina Martins Araujo Santos LUKOIL Latin American Utility Week Legislação Gás Natural Licenciamento Ambiental London School of English Londres Luiz Carlos Mendonça Barros Lupatech Líbia MANUAL DE DIREITO DO PETRÓLEO MMX MP 579 MPX Magda Chambriard Manguinhos. Rio de Janeiro Mapa Geopolítico Mar Negro Mar do Norte Maranhão Maricá Marsk Matriz energética Medida Provisória nº 627/2013 Mercado de Curto Prazo Mercosul Michael Page Ministro de Estado de Minas e Energia Norma ISO 50001 Northon TORREZ VARGAS Nova Lei do Gás Natural Nova Petróleo Nova York O petróleo é nosso OABRJ OGX e OSX ONU OTC 2012 – Offshore Technology Conference Odebrecht Operador Nacional do Gás Operador Nacional do Sistema Elétrico Ouro PARECER PCH PEC 33 PGE PIS PIS/COFINS PIS/Pasep PPP PPSA PROJETO DE LEI DO SENADO PTT PanAtlantic Panoro Energy Para nossa alegria Paraná Paru Pasadena (EUA) Patos Pemex Penta Energia Petrobras. Seguro Petrochina Petrogal Brasil Petronas Petróleo ETC Plano Decenal de Expansão da Malha de Transporte Dutoviário do País Política Energética Nacional Política Nacional de Resíduos Sólidos Pontal do Paranapanema Portaria MME nº 192 Portaria nº 160 Portaria nº 191 Porto do Açu Portos Portugal Premier Oil Premium I Premium II Princípio da continuidade Projeto Estruturante Proyecto de ley de hidrocarburos de Gobierno de Argentina Quênia RESERVATÓRIOS RTT RWE Dea AG Regulatória Regulação Repar Repsol Explorácion Resolução Revista Brasil Energia Revista Exame Revisão Tarifária Extraordinária Rio Grande do Sul Rio Oil & Gas Rio Oil e Gas 2012 Roberto Viana Rosneft Rússia SEDE SIN SYNERGIA EDITORA Saipem do Brasil Sasol Secretaria de Energia Secretário de Energia de São Paulo Sindicato da Indústria Cerâmica Sinopec. Galp Sistema de Gestão de Energia Snam South Stream Steve Coll Subsea Oil e Gas Brasil Sulgás São Carlos TAC TCC TCU TNK-BP TUSD TUST Termo de Compromisso Texaco The Economist Tomanik Pompeu Advogados Associados Total. Tractebel Transierra Tucumann Engenharia UE UPGN COMPERJ UTC Óleo e Gás UTG UTGCA Unidade de Tratamento de Gás Monteiro Lobato Usuário de Serviço Público V Fórum Capixaba de Energia Valter Esperidião Silva Vanco Brasil Venezuela Venrzuela Videocon Industries Visões do Gás Wintershall Wärtsilä Brasil abastecimento agosto/2013 alterações tributárias análise de risco aquecimento global armazenamento aspectos técnicos atividades autoimportadores ações balanço financeiro barragens biocombustíveis capacidade carro cenário energético certificação cesta de óleos clipping cogeração combustíveis combustíveis fósseis comercializadora comercializadores commodity companies competência federal compliance compra e venda concessionárias de distribuição de gás canalizado concessões concessões das hidroelétricas consumidor consumidores contrato de distribuição de gás canalizado criação critérios curso de inglês cãmbio declaração de comercialidade decreto de desapropriação demanda descobertas desenvolvimento desenvolvimento sustentável desindustrialização precoce devivados dezembro diretor de Regulação Econômico-Financeira e de Mercados diretoria de Gás Canalizado diretrizes doença holandesa. due diligence déficit comercial educação emprego emprego da técnica energia renovável energia solar energias renováveis energy exploração pré-sal explosão exportação extração de petróleo e gás financeira fontes não convencional frade gasoduto virtual gestão de gás gestão energética gás importado gás natural comprimido gás natural preço gás natural; distribuição de gás canalizado; auditoria energética inconstitucional investidores investimento invetimento jazidas julho lixo lockdown make-up gas maldição do petróleo matéria prima migração ministério público ministério público federal mundial nacionalização novembro ocid tomanik oeste paulista offshore operação de petróleo outubro penalidades perfuração de poços pesquisa e desenvolvimento petrolífera estatal boliviana plástico poluição política nacional para o gás natural prestação de serviço de movimentação de gás canalizado processo administrativo produtores projeto siderúrgico da Ceara Steel proteção e defesa quarentena queima de gás ranking recessão economia reduzir redução redução PIS/ Cofins região sul reservas revolução na indústria globa revolução na indústria global seminário serviços públicos solar suspensão terminologia treinamento usina utilities África África Austral África Oriental